Edição LV (Terça Livre, Revista Esmeril 31, opinião e mais)
REVISTA ESMERIL 31
- E agora, você vai rir de quê? (Lobo)
- Democracia: essa nunca enganou ninguém! (Antonio Fernando Borges)
(matérias de edições antigas da revista que ainda são atuais)
as direcionaram para a revolução. Entrementes, todo esse processo histórico-cultural fez da Cultura o espaço da civilidade, da cortesia, da polidez. Da civilização.
E aqui se encontra o dilema! Décadas de esquerda no poder, de instrumentalização da Educação e da Cultura, além de formar bacharéis iletrados, analfabetos funcionais,
forjou brutos. Rudes, os brasileiros educados no construtivismo paulofreiriano das décadas de 80/90, do final do século XX e início do XXI, sequer compreendem o sentido de uma ironia. Além de broncos, além de hipersensíveis a quaisquer críticas (paradoxo dos paradoxos), são literais. Incapazes de algo mais complexo, mais refinado, mais ambivalente, mais humano, são difíceis no dialogar com quem pensa diferente – e isso em todo o espectro político. Por isso discutem, agridem, gritam. Berram. No início do séc. XX, reza a lenda que Lênin (1870-1924) afirmou preferir conversar com um capitalista inteligente do que com um comunista burro. Mito ou não, não é verdade que é sempre melhor dialogar com inteligentes do que com inteligentinhos?
E a direita chegou ao poder. Mesmo sem saber exatamente o que é ser de direita, a direita brasileira se uniu em torno da ojeriza ao PT. E ao PSOL, ao PSDB, ao PCdoB... À histórica roubalheira petralha. Aos “Josés Dirceus”, “Dilmantas”, “Moluscos & Cia” etc. No “Ano I”, o choque, a descoberta do volume do roubo, dos rombos multibilionários, do aparelhamento quase que completo do Estado, das estruturas. O enfrentamento nas câmaras, as badernas e o choque de realidade com a divulgação ministerial da devastação das drogas nas universidades federais. Do tráfico à luz do dia. No fim do ano, o início dos projetos culturais – da cívica e independente recuperação da educação clássica à defesa parlamentar do homeschooling. Mas como lidar com a nomenklatura e a “classe” artística, há décadas defensora do “É proibido proibir” (1968), dos uivos de Yoko Ono (1933-), da arte de vanguarda dos urinóis duchampianos e das fezes enlatadas de Piero Manzoni (1933-1963)? Como, se é o próprio Estado quem incentiva a arte e premia os artistas?
Sobretudo, como reagir às tradicionais ofensas religiosas que a arte dos sécs. XX e XXI, revolucionária, faz contra o
Cristianismo, já que, a partir de 2019, o Brasil redescobriu sua fé com a avalanche evangélica vitoriosa nas urnas? Sim, porque se dependêssemos da Igreja Católica, o PT seria novamente vencedor – e avançaríamos rumo ao socialismo bolivariano, como a Venezuela, que hoje presencia até animais do zoológico passando fome, esquálidos.
Repitamos, esquematicamente: de um lado, a imprensa, a “classe” artística, as universidades. A intelligentsia. Do outro, a população, agora detentora das redes sociais, da Internet. As famosas tias da Internet, além dos grupos bolsonaristas de pressão. Novamente: de um lado, quem era formador de opinião e não é mais (ou pelo menos não tem mais a hegemonia como antes). Povo furioso, “intelectuais” ávidos para retornar ao poder. Do outro, uma massa ainda amorfa, basicamente religiosa, simples, simplista, que está com e apoia o poder vitorioso das urnas.
Infelizmente, os dois lados foram formados na cultura revolucionária. Raciocinam sempre em termos materiais. Como fui educado em escolas tradicionais da década de 60, época em que ainda o Concílio Vaticano II (1962-1965) não havia triunfado nas estruturas eclesiásticas, quando tínhamos que deixar a namorada em casa às 22h, quando ainda tínhamos padres de batina e vivíamos em um país tradicional, sem divórcio, que criticava as guitarras elétricas no samba e se opunha veementemente aos palavrões nos estádios de futebol – para dar só alguns exemplos que parecem saídos de um mundo do séc. XVII –
vivi in persona a transição desses dois mundos. De Noite Ilustrada (1928-2003) e Altemar Dutra (1940-1983) a Caetano Veloso (1942-) e Gilberto Gil (1942-). Por isso, como nasci (e cresci) na tradição e amadureci na revolução, acompanhei a decadência cultural, o ostracismo da língua portuguesa e a valorização dos maus-modos. Do funk. Por isso afirmo, sem pestanejar, que nosso ambiente é decadente, intelectualmente insalubre. Assim, como rudes resgatam a civilidade? Como ásperos ressuscitam a polidez? Como brutos se sensibilizam?
Não há outro caminho senão o do diálogo. Mesmo que seja um diálogo entre bárbaros. Entre vikings. Pior: mesmo que, nos saxões “do lado de cá” tenhamos, aqui e ali, oportunistas que, como Juruna (1943-2002), saiam, com celular em riste e oculto em suas capas, gravando ilegalmente diálogos republicanos que ofendam ouvidos ávidos por cargos na Cultura. Isso porque, dos vikings “do lado de lá”, o que prepondera são Jurunas com dólares na cueca, hoffman’s lovers, valente’s socialistas, postes haddadianos, kokays urradoras...
Vikings e saxões devem dialogar. E encontrar os 10% de concordância em meio aos 90% de divergência. Nem que sejam 5%. Ok, mesmo que seja 1%! Mas na totaler krieg in full time não é possível administrar uma nação, muito menos a Cultura, que precisa ser acariciada, acarinhada, sobretudo amada. O que precisamos é que, “do lado de cá”, tenhamos ouvintes decididos, pessoas “roucas de tanto escutar”, mas resolutas. Cidadãos firmes em sua intransigência republicana, hostis ao nepotismo, que reajam às pressões indevidas e, last but not least, que se escandalizem, horrorizados, com o fisiologismo, pois, que há, há, ah, se não há! “Yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay”. Eu mesmo já vi, aqui e ali...
Só assim “o lado de lá” verá firmeza indelével. E negociará. Pois há esquerdistas que sabem negociar. Ah, como sabem. Mas entendam, seus literais: “negociar” é conversar. Pois Política é a arte do diálogo. De opostos, preferencialmente. Quem sabe consigamos, nesse processo, educar ambos os lados? Especialmente “os de lá”, espero... Os fisiologistas de cá, meu sonho, é que sejam defenestrados. Para New York!
Nascido na cidade de Maranguape, município da região metropolitana de Fortaleza, no Ceará, Francisco Anysio de Oliveira Paula Filho, vulgo Chico Anysio, mudou-se para o Rio de Janeiro com sua família, ainda quando criança, após a empresa de ônibus de seu pai ter sido completamente destruída em um incêndio.
O menino que sonhava em ser advogado, acabou descobrindo na escola sua habilidade natural para o humor, especialmente na arte de imitar professores, colegas e figuras da cidade.
A brincadeira foi ficando séria e então, aos 17 anos de idade, foi trabalhar nas rádios como locutor, após ter ido excepcionalmente bem em um teste, no qual pegou o segundo lugar, perdendo para ninguém menos que Silvio Santos, por quem, aliás, Chico, até o fim de sua vida, sempre teceu os mais entusiasmados elogios.
Um fato bastante curioso é que num teste para ator de rádio, Chico tirou o sétimo lugar, enquanto a vencedora foi Fernanda Montenegro.
Com o sucesso nas rádios, Chico passou de ator/locutor a comentarista esportivo, além de escrever roteiros de programas de humor para a TV e diálogos para filmes, chegando inclusive a atuar em alguns.
O primeiro personagem criado foi o Professor Raimundo, que surgiu em 1952 na Rádio Mayrink Veiga, chegando na TV só cinco anos depois como escada para a comediante Ema D’Ávila em “Aí Vem Dona Isaura”, na TV Rio.
Tamanha habilidade levou Chico a tornar-se diretor e criador de programas de humor da emissora, como “O Riso é o Limite” e “Praça da Alegria”, no tempo em que toda a programação da TV era feita ao vivo.
Foi Carlos Manga, diretor com quem Chico havia trabalhado como roteirista de 18 chanchadas para a Atlântida, quem teve a ideia de fazer um programa com Chico e seus personagens, já que naquele momento havia surgido o “videotape”, o que facilitaria o “dom da multiplicação”, juntando num único programa todos os diversos personagens do multifacetado ator comediante.
Chico Anysio foi contratado pela Globo em 1969 e no ano seguinte estreava na emissora “Chico Anysio Especial”, o programa mensal dirigido por Daniel Filho. O sucesso foi tão grande que pouco tempo depois nascia o “Chico City”, desta vez um programa semanal responsável por tornar Chico uma das estrelas mais famosas e respeitadas da então poderosa emissora.
Exibido as sextas feiras, o programa com quadros e esquetes ambientados numa pequena cidade imaginária, durou até 1980 e consagrou personagens icônicos como o ator canastrão Alberto Roberto, o mitômano coronel Pantaleão, o velho ranzinza Popó, o alcóolatra Tavares, o locutor Roberval Taylor, e tantos outros que ainda vivem no imaginário popular do brasileiro.
Mas como se não bastasse ser um ótimo locutor, redator e também ator e humorista, Chico alçou outros voos lançando livros, pintando quadros, fazendo shows de stand up (inclusive no Carnegie Hall em Nova York) e até compondo músicas de sucesso, como o “Hino dos músicos”, composição em parceria com Chocolate e que acabou também se tornando o tema dos programas de Chico Anysio.
Mas como todo gênio que se preza, o humorista pensador e contestador não fazia duras críticas à sociedade apenas através de seus mágicos e eficientes personagens, mas também era provocador nas entrevistas, sempre deixando bem claro seu ponto de vista, independentemente de seguir na contramão do mainstream do qual ele fazia parte, algo raro de se ver nos dias de hoje onde a lei é lacrar e fazer de tudo para se tornar parte da “beautiful people”, inclusive deixar de pensar através de sua própria mente.
Talvez por isto Chico nunca tenha sido muito bem tratado pela imprensa, que sempre o incluía em confusões homéricas e mal entendidos, inclusive com colegas de profissão, como quando ao fazer uma critica construtiva a Jô Soares, a imprensa deturpou a fala e causou um mal estar entre a dupla de comediantes, que se seguiu de longos anos de distanciamento entre ambos.
Talvez por isto Chico também nunca tenha se rendido ao quarto poder e sempre tratou jornalistas com elegância, mas nunca sendo submisso às vontades dos microfones e canetas ardilosas, tendo em vista uma das célebres declarações do humorista sobre a imprensa que o criticava:
“Quando eles passaram anos me chamando de gênio, tive a genialidade de não levar isso a sério, portanto não é agora que me chamam de idiota, que vou cometer a idiotice de acreditar.”
Ouso dizer que Chico não foi o maior humorista do país, e sim um dos maiores atores que o mundo já conheceu.
De extrema generosidade para com os seus, Chico foi talvez o homem de TV que mais empregou e deu oportunidades a comediantes novatos e veteranos, transformando alguns em fenômenos, vide o caso de Tom Cavalcanti.
Para se ter uma ideia, a “Escolinha do Professor Raimundo” foi um dos programas mais duradouros da TV brasileira e entre as décadas de 1990 e boa parte de 2000 foi considerada o maior programa de humor do mundo ocidental, deixando até o poderoso Bill Cosby para trás. A Escolinha era diária e batia 40 pontos no IBOPE, atingindo dezenas de milhões de espectadores, ultrapassando a audiência do famoso programa americano.
Professor Raimundo, a maior escada para os humoristas dos programas da TV brasileira, revelou e empregou dezenas de atores e grandes comediantes, até mesmo o lendário Mussum dos Trapalhões, descoberto por Chico e inclusive por este incentivado a criar a “linguagem” original repleta de forevis, cacildis, ironicamente hoje confundida com a tal linguagem de gênero neutro, possivelmente criada pelo catedrático “Mumu da Mangueira”, que já se mostrava anos luz a frente de seu tempo.
Olha aí ABL, depois de Fernanda Montenegro e Gilberto Gil, creio que Mussum também venha merecer uma cadeira de imortal por sua contribuição à língua, certo?
Apesar de toda relevância e genialidade, Chico Anysio viveu seus últimos anos atuando discretamente em novelas e programas de TV. Um dos últimos e brilhantes trabalhos de Chico foi dublando o carismático velhinho Carl Fredricksen, da animação “Up – Altas Aventuras”, da Pixar, assim como coincidentemente, o último trabalho do galã Paul Newman foi dando voz ao personagem Duc Hudson em “Carros”, animação também da Pixar.
A gigantesca criatura, agora com 210 cabeças, urrava de dentro da jaula da submissão e do esquecimento, mas com a certeza de uma história admirável e ter feito escola.
Quantos Chicos não estão ainda hoje por aí buscando sua oportunidade longe dos likes das redes sociais, tão prostituídas, mas perto do coração, da mente e do riso gostoso, saudável e que ainda nos faz pensar?
No final, o que mais se destacam hoje são os discípulos de Pantaleão e de Bozó, onde o que vale é o exagero da mentira e a “carteirada” fajuta para impressionar o público ingênuo que se satisfaz com o sonho da celebridade.
Chico Anysio, como um Shakespeare abrasileirado, descreveu tão bem a alma de nosso povo com seu olhar tão preciso e poderoso.
Suas criações eram diferentes umas das outras e você nunca via Chico, mas sim os 209 cidadãos nascidos da mente deste brilhante homem.
O mal caráter Justo Veríssimo esta ainda estampado nitidamente na face de grande parte de nossa política, assim como não faltam Tim Tones, o retrato fiel dos falsos religiosos sempre com a sacolinha (e a busca por votos) à frente da fé e do amor.
O machismo escarrado e agressivo de Nazareno escancara com a estúpida e patética imagem do homem grosseiro, enquanto o irresistível Silva, ainda prova que beleza não põe à mesa, quando se tem o talento e a sabedoria de compreender e tratar com elegância e respeito uma mulher.
Nossa CBF continua dirigida por Coalhadas e nossa mídia dominada por Haroldos, que longe das câmeras querem morder você todinho em troca de uma chance e caso você não aceite, ele lhe rotula como homofóbico. Talvez pelo medo do cancelamento ou ânsia pela ambição surjam tantos Albertos Robertos invadindo o dia a dia das donas de casa e trabalhadores cansados, que tentam apenas relaxar na frente do aparelho sugador de almas.
As mensagens implícitas do véio Zuza e as explícitas de um velho Profeta nos dão a esperança de que isto ainda vai melhorar, tenhamos fé.
Enquanto isto, nós, eternos Bentos Carneiros, vampiros brasileiros, agradecemos por Chico ter nos dado praticamente todo seu sangue.
Num universo talvez não muito distante, o imortal Professor Raimundo deve estar ao lado de seus mais notáveis alunos, como Costinha, Grande Otelo, Rogério Cardoso, Orlando Drummond, Walter D’Ávila, Zezé Macedo, Rony Cócegas, Brandão Filho, José Vasconcelos, Zilda Cardoso e tantos outros, sempre pronto para uma nova temporada de lições.
O que muitos de nós, dez anos atrás, não esperávamos, é que poucos dias depois do Professor Raimundo ser escalado pro andar de cima, o diretor geral da escola do humor, o mestre prolífico Millor Fernandes, também seria convocado.
O céu vai continuar sorrindo, enquanto nós por aqui ficamos na utópica espera de um mundo novo com mais Chicos e Millores.
E a saudade ó!
Não são poucos os que pensam que o descrédito dos ideais democráticos é um fenômeno recente, resultado dos bombardeios constantes tanto de conservadores quanto de “progressistas” (comunistas e assemelhados). Mas a verdade é que a história desses “ideais” é antes de tudo a saga milenar de uma decepção anunciada. Ao longo dos tempos, sobretudo no plano conceitual, a democracia nunca desfrutou de opiniões unânimes e lisonjeiras. E essa depreciação é muito mais antiga do que supõe nossa vã filosofia. Porque Tocqueville, Franklin e Churchill e tantos outros tiveram um antecessor de peso, nem sempre lembrado: o historiador grego Políbio (203-120 a.C.).
Lá no alvorecer da civilização ocidental, Políbio já alertava para o perigo subjacente à então recém-nascida forma de governo: a tal Democracia, que se propunha cuidar dos interesses dos “direitos coletivos dos habitantes”, nas cidades-estado que giravam na órbita da poderosa Atenas. A páginas tantas de sua clássica obra Histórias, ele cunhou o conceito de oclocracia (okhlokratia: literalmente, “governo da turba”) para nomear aquilo que considerava uma variante “mórbida” ou “patológica” do governo popular. Mais especificamente, para Políbio e seus contemporâneos, a oclocracia seria uma das três formas ruins de governo (ao lado da tirania e da oligarquia), em oposição às três formas boas: monarquia, aristocracia e politeia (designação das cidades-estado que tinham uma “assembleia de cidadãos” como peça-chave de seu processo político).
Mas… onde entra a Democracia, em tudo isso?
Costumeiramente moderados, os ingleses no entanto sempre esbanjaram acidez e veneno no “elogio” da Democracia. Lorde Byron, por exemplo, expoente do Romantismo, mostrou-se ao mesmo tempo realista e imaginoso: “O Diabo foi o primeiro democrata”. E, ainda dentro das fronteiras britânicas, o pensador liberal Thomas Macaulay expressou desconfiança bem semelhante: “Estou convencido de que, mais cedo ou mais tarde, as instituições puramente democráticas vão destruir a liberdade ou a civilização – ou quem sabe as duas”.
Do lado de cá do Atlântico, a Democracia não se saiu melhor. O estadista americano Benjamin Franklin, paladino das liberdades, nem por isso economizou veneno e acidez: “Democracia são dois lobos e uma ovelha decidindo sobre o que comer no jantar”. E Thomas Jefferson, principal autor da declaração de Independência dos Estados Unidos, acrescentaria que a democracia “não é nada mais do que a ditadura da multidão, onde 51% das pessoas podem tirar os direitos dos outros 49%”. O argentino Jorge Luís Borges, conservador assumido, é igualmente direto: “A democracia é um erro estatístico, porque nela a maioria decide, e a maioria é composta de imbecis”.
Além dessa algazarra de citações involuntariamente engraçadas, também há lugar para o humor profissional, com dois mestres no assunto. De um lado do oceano, o britânico Bernard Shaw: “A democracia é apenas a substituição de alguns corruptos por uma porção de incompetentes”. Do outro, o irreverente Millôr Fernandes: “O problema da democracia é que ela acaba sempre na mão dos democratas”.
Mas talvez ninguém tenha chegado tão perto da lucidez de Políbio quanto Alex de Tocqueville – o mais americano entre os franceses. Autor não de uma ou duas frases, mas de pelo menos dois livros inteiros sobre o assunto – em especial, Da Democracia na América e O Antigo Regime e a Revolução –, Tocqueville mostrou que os ideais democráticos não eram (nunca foram) solução, e sim uma parte do problema. Para ele, a “democracia na América” só daria certo se estivesse assentada numa síntese indissolúvel de liberdade exterior e autocontrole moral e religioso.
(Enquanto isso, o burocratismo dos progressistas e libertários inverte o paradigma, fomentando a irresponsabilidade pueril que suscita a proliferação de bedéis, fiscais e sargentos de polícia – em suma, o proverbial “guarda da esquina”).
O americano tradicional sabia que era possível haver governo limitado e liberdade para todos, desde que cada um fosse capaz de: governar a si mesmo, ler a Bíblia e abdicar de “cobiçar a mulher e os bens do próximo”. Na contramão desses nobres princípios, o estatismo que hoje vai tomando conta do mundo prefere incentivar a cobiça e a inveja generalizadas, adornando de “motivos” sofisticados (na verdade, cínicos pretextos) a recusa do autocontrole e a proclamação arrogante do primado do prazer sobre o dever.
No fim das contas, guardadas as diferenças pontuais de cada época, autores como Políbio e Tocqueville demonstraram que uma sociedade baseada na liberdade individual não cabe plenamente na palavra democracia. Por isso seu futuro não depende do utópico e insaciável “aperfeiçoamento das instituições” – e sim da religião sincera, da ética aplicada à vida e aos negócios, e também da boa formação intelectual da elite. Em suma, todas aquelas coisas que costumam ser desprezadas pelos loucos ou revolucionários que depositem na política e no Estado todas as esperanças.
***
“O Diabo foi o primeiro democrata”.
— Lord Byron (1788-1824),
poeta inglês.
Por boca do profeta Jeremias, Deus repreendeu os pastores de Israel pela falsa doutrina e o mau exemplo (cf. Jr 23, 1-6). Eles permitiam às ovelhas desviar-se e substituir a Aliança de Deus pelas próprias opiniões, provocando erro e confusão. Quando veio Jesus, séculos mais tarde, o povo estava disperso como ovelhas sem pastor. Ele as amou e teve piedade delas, ensinando-as por palavras e exemplos (cf. Mc 6, 34).
No século passado, muitos líderes cristãos, inclusive sacerdotes e bispos católicos, negligenciaram ou enganaram seus rebanhos — o que se evidencia, de modo particular, pela ampla aceitação do individualismo, do subjetivismo e do consumismo, bem como pelo abandono das concepções cristãs de pessoa humana, sexualidade, matrimônio, família e sociedade.
Ao longo da história do povo de Deus, pastores e ovelhas se mostraram infiéis repetidas vezes, porque somos propensos ao erro, ao egoísmo e ao pecado. Por isso, cada um de nós e toda a Igreja temos sempre necessidade de purificação (semper purificanda), a fim de sermos aperfeiçoados em nosso conhecimento, amor e serviço generoso a Deus e ao próximo.
Para entender a crise atual, é preciso reconhecer que, antes da ordenação, nossos pastores eram ovelhas, educadas em famílias e paróquias específicas. Hoje, ensinam o erro intencionalmente na mesma proporção em que seus pais e pastores procuraram enganá-los. Mentiras foram e são ensinadas. Se isso não fosse frequente, nossas paróquias e famílias seriam muito diferentes.
Geralmente, o clero e o laicato não alteram ou abandonam os ensinamentos de Jesus pelo desejo explícito de contradizer seu amor e sua verdade. Em vez disso, acreditam que suas experiências revelaram um sentido diferente do Evangelho, mais profundo e compatível com suas circunstâncias. Podem até mesmo ter aprendido crenças e práticas falsas em casa, na catequese ou no seminário. Naturalmente, também é possível que essas distorções sejam esforços egoístas de fazer a fé e a moral cristã corresponderem às próprias opiniões.
São Paulo chama a isso “conformar-se ao mundo”, e não a Cristo. Lidar com essa realidade em nossas vidas e na Igreja pode gerar tristeza, vergonha, confusão, frustração e raiva. Reagimos assim porque queremos que todos conheçam e amem a Deus e participem de sua vida abundante e eterna. Reconhecemos que viver segundo falsos caminhos (com ou sem culpa) é um perigo para nós e para os outros, e o que queremos é poupar a todos do sofrimento desnecessário causado pelo pecado. Queremos sobretudo que nossos pastores deem testemunho e suporte autênticos.
Mas se a nossa resposta ao erro e ao pecado não estiver enraizada no amor a Deus e ao próximo, poderá assumir formas corruptas que levam à negação (evitar lidar com o problema), ao desespero (por nos sentirmos impotentes) ou à ira (por ficarmos obcecados com a ideia de derrotar um mal sem solução). Só a união com Cristo nos pode dar a fortaleza e a caridade necessárias para ver e responder com a mesma autenticidade dele.
Sabemos o que Jesus viu: pastores desobedientes e ovelhas dispersas; e sabemos como Ele respondeu: com uma compaixão nascida do amor. Sabemos o que Ele fez: ensinou dando testemunho da verdade e do amor de Deus e atraindo todos a si. Assim, permitiu que todos, pastores e ovelhas, participássemos de suas alegrias e tristezas, para além de tudo o que está certo e errado em nós, nos outros, na Igreja e no mundo.
A boa-nova é que não temos motivos para temer a verdade, nem mesmo quando ela revela situações prejudiciais ou catastróficas devidas ao erro e ao pecado. Podemos alegrar-nos e exultar com essa revelação, apesar das fortes e dolorosas emoções causadas por ela. Nossa alegria vem do fato de encararmos a verdade e de sabermos que Jesus está presente, atraindo-nos a si para que possamos participar de sua vida e dar uma resposta, arrependendo-nos do pecado, abandonando o erro e lidando da melhor maneira possível com tudo o que possa haver de errado em nossa vida e na Igreja.
Quando nos unimos a Cristo, nosso fardo se torna “leve” e não consegue nos esmagar como o fariam a negação e o desespero interminável. Ao contrário, ele nos dá esperança e vida — inclusive diante de males incorrigíveis deste lado do céu. Com Ele conseguimos aceitar a necessidade constante de purificação, enquanto admitimos e suportamos nossas falhas e as dos nossos pastores.
A tristeza sentida quando suportamos o mal não tomará conta de nós nem nos deixará paralisados. Em Jesus, ela se torna uma motivação contínua para permanecermos em combate, perseverando na oração e, se a Providência o permitir, corrigindo males concretos do nosso meio.
Essa purificação e essa tristeza podem ser suportadas, ainda que nossas vidas, famílias, paróquias, nação e cultura sejam destruídas em termos humanos, porque em Cristo nada pode nos separar de Deus e de seu amor. Na verdade, essa purificação e essa tristeza podem ser suportadas precisamente porque elas são o amor de Deus operando em nós à medida que lutamos com a nossa natureza caída e as nossas famílias, a Igreja e o mundo, que passam por períodos turbulentos.
Portanto, diante dos desafios e sofrimentos da vida, não há necessidade de adaptar o Evangelho às nossas expectativas nem de desesperar por conta de escândalos e derrotas dolorosas. Precisamos apenas dar com alegria um testemunho diário de purificação e carregar a cruz com Ele. Isso é o Evangelho.
Evidentemente, nossos pastores desobedientes jamais aprenderam esse Evangelho, ou o esqueceram, ou decidiram subvertê-lo. Muitas ovelhas dispersas enfrentam o mesmo dilema. Perambulam inquietas, como cegos guiando cegos.
Ignorar, temer ou lamentar a situação não ajudará em nada. Tampouco ajudam as teorias da conspiração, as “soluções” simplistas e as discussões. Só descobriremos em Jesus a compaixão, a esperança e a força necessárias para sermos fiéis testemunhas dele, de sua verdade e de seu amor, se reconhecermos a realidade escandalosa, o erro e o pecado em nossas vidas.
Guiados pela Providência, nosso testemunho poderá resolver ou não a crise de formas consideradas oportunas e satisfatórias, mas qualquer outra resposta com certeza será prejudicial e fútil para nós e para a Igreja. Temos de perseverar em nosso testemunho e rezar por nós e por nossos pastores: “Senhor Jesus, tende piedade de nós!”
Para encontrar as redes sociais de Allan Dos Santos e Terça Livre, veja a lista abaixo:
GETTR de Allan Dos Santos: https://gettr.com/user/allansantosbr
GETTR do Terça Livre: https://gettr.com/user/tercalivre
CloutHub: https://clouthub.com/c/tercalivre
Instagram: https://instagram.com/realallandossantos
Odysee do Artigo 220: https://odysee.com/@Artigo220
Odysee do Terça Livre TV: https://odysee.com/@tercalivre
Odysee de Allan Dos Santos: https://odysee.com/@allandossantos
YouTube do Terça Livre: https://www.youtube.com/channel/UCjclm-vtSde3xPGpQku7djA
Todo psicopata é, por definição, psicologicamente invencível. Por mais que você lhe mostre seus erros e prove os seus crimes, ele continuará não só proclamando inocência, mas cantando vitória.
Conversa vai, conversa vem, e eis que passa na frente deles um sujeito meio porra-louca. Cabelo metade comprido e metade cortado, a metade comprida toda pintada de verde-limão, estilo neon, com piercings na cara até perder de vista e uma série de tatuagens malucas que iam do pescoço até o final da perna. Era bem esguio e magricela, e vestia uma jaqueta preta, blusa rosada, e um short roxo neon com uma meia de cada cor na canela, uma preta e uma branca, um tênis Kichute em um pé e um chinelo no outro. O tipico revoltado social. Só faltava xingar o Presidente da República!
Amazeck não perdeu tempo e, vendo o sujeito, comentou: "véi-do-céu, repara só no elemento, cê viu?"
Wisenton olhou para figura social que acabou de passar e simplesmente disse: "é, eu vi. Doido, né?"
Amazeck ficou impressionado com a resposta meio "deixa para lá" do amigo. Aquilo era demais até mesmo para ele! "Meu, imagina teu filho sentado aqui vendo uma figura dessas, cê é louco que eu vou continuar andando por essas pradarias!" Mas isso não parece ter impactado Wisenton a ponto de manifestar ojeriza ou aprovação. Apenas disse: "aah, cada um anda do jeito que quer, né? O que vale é o conteúdo." Amazeck pensou, e completou: "pelo menos que não seja comuna!" Wisenton, em um acesso de bom-mocismo, respondeu: "tanto faz se é comuna ou se não é, o importante é ser de boa".
Logo, Amazeck começaria o que Wisenton chamava de "cantilena", dizendo que as pessoas perderam o senso de ridículo, que a beleza era um animal em extinção, e que o rapaz tinha que pensar mais no que ele chamava de "altos valores morais" antes de ficar dando moral pra comunas. Só que Wisenton não tinha esse apreço todo por qualquer coisa que fosse, a não ser ele mesmo. Ele sempre foi aquele cara que só quer se sair bem na fita, "fazer o meio de campo com a galera". "Nem muito à esquerda, nem muito à direita, sempre pra frente!", dizia ele, sempre cheio de orgulho!
Olhava com desdém aquele pessoal muito extremado. Se achava um grande exemplo ao pensar "consigo falar tanto com o pessoal de lá, quanto com o pessoal de cá, sem problema. Agrado todo mundo. Não tenho desafetos, todos me acham uma grande figura."
Como Amazeck tinha tudo menos firmeza no que dizia, a coisa acabou descambando para a gozação: "ah, então tu também ia sair daquele jeito lá se desse uma brecha, né seu brocha? Hahaha! Imagina só tu de cabelinho pintado!" Mas o rapaz de camisa pólo e sapatênis rejeitou a ideia: "eu não, cê é doido! Só te disse que pra mim tá de boa, normal, ué!" Mas se tinha uma coisa que Amazeck sabia fazer bem era provocar! "Ah, conversa, Raul! Tu ia pintar o bebelinho aí na primeira chance que tivesse, que eu sei, hahaha!" Mas o rapaz simplesmente ignorou a provocação. Não que isso tivesse feito ela parar: "Cê é coloridofóbico que eu sei, rapá!"
Começando a soprar pra não perder a calma, Wisenton simplesmente pediu licença e saiu de onde estava. Após andar um pouco pelo calçadão, Wisenton começou a perceber que uns sujeitos o seguiam. Mudou de rota para ficar longe de encrencas, quando de repente deu de testa com outra pessoa. Era o tal sujeito colorido que tinha visto lá no restaurante, desabando no chão, além de ter perdido o seu Kichute de um dos pés.
Esquentado com a situação, o sujeito esbraveja: "olha onde cê tá andando, porra!" Tentando se defender, Wisenton pediu desculpas ao "cara". Tentando pedir desculpas, descobriu que se tratava de uma menina. Tentou se corrigir. Descobriu que a menina se achava um homem; e negro, apesar da pele branca. Tentou tratá-la como ela queria. Mudou a abordagem, afinal, tinha uma biografia a zelar! Tentou usar expressões neutras. Só que nunca teve que lidar com alguém tão difícil. Vendo que não tinha jeito, sugeriu gentilmente que ela esquecesse tudo que houve. Foi parar na polícia. Foi acusado de preconceito, lgbtfobia, tentativa de estupro e violência contra mulher. Perdeu o emprego no dia seguinte.
(06/05/2022) |
Comprar |
Comentários
Postar um comentário