Edição XLIX (Terça Livre, Revista Esmeril 30 e mais)
REVISTA ESMERIL 30
- Entrevista com Paulo Henrique Araújo (Leônidas Pellegrini)
(matérias de edições antigas da revista que ainda são atuais)
Nesta semana, na quinta-feira (24), a invasão russa à Ucrânia, que prometia ser um conflito a ser resolvido em questão de poucos dias, completa um mês. Nesse interregno, forças revolucionárias do Ocidente e do Oriente disputam terreno entre si para a implementação de suas agendas globais, e a maior vítima desse processo tem sido o povo ucraniano, diariamente bombardeado.
A guerra se estende aos grandes veículos de mídia e às redes sociais, onde nos deparamos com analfabetos funcionais posando de especialistas em Relações Internacionais, neocons aplaudindo o “conservadorismo” de Vladimir Putin, e, como sempre, oportunistas se aproveitando da situação para se promoverem em ano eleitoral (no Brasil, por exemplo, são incontáveis os casos, talvez o mais emblemático o do deputado federal que viajou para o leste europeu para tirar selfies com coquetéis molotov e paquerar refugiadas de guerra).
Nesta semana, também, na sexta-feira (25), o Papa Francisco consagrará a Rússia e a Ucrânia ao Imaculado Coração de Maria, e desse evento, ou melhor, do debate que ele vem gerando, pode ser revelado o ponto central do que estamos vivendo: uma guerra espiritual. Trata-se, como bem assinala o analista político Paulo Henrique Araújo, de uma “guerra civilizacional, de valores culturais, e aquilo que precede a cultura é a religião, é a nossa fé, aquilo que baliza a moral do Ocidente, a fé cristã.”
Paulo Henrique Araújo, assim como os demais membros do Grupo PHVox, tem feito, a exemplo do que fizeram com as eleições americanas entre 2020 e 2021, as melhores análises, dia a dia, dos conflitos envolvendo Rússia e Ucrânia, suas razões históricas e mesmo teológicas, a manipulação midiática e os agentes revolucionários envolvidos nesse processo, entre outros fatores relacionados a esses eventos. É ele quem traz para esta edição da Esmeril alguns esclarecimentos essenciais para o entendimento não apenas do conflito Rússia-Ucrânia, mas do momento histórico que estamos vivendo, um momento decisivo para a civilização ocidental, e também para cada um de nós, em relação ás escolhas que faremos para a salvação de nossas almas. Que a Virgem de Fátima, protagonista dos eventos da próxima sexta-feira, rogue pela Rússia, pela Ucrânia, e por cada um de nós.
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Revista Esmeril: Paulo, há diversos assuntos relacionados à situação do mundo em relação à Rússia neste momento, e muitos têm sido muito bem analisados pelas coberturas do PHVox. Em primeiro lugar, eu gostaria que falasse, mesmo sabendo que Vladimir Putin se vale de pretextos os mais diversos (até das Sagradas Escrituras) para justificar suas ações imperialistas, se existem, historicamente, motivos para este celeuma com a Ucrânia em particular.
Paulo Henrique Araújo: Existem, sim, motivos históricos que determinaram essas ações. Mas precisamos, em primeiro lugar, quebrar alguns paradigmas. Pelo fato de Vladimir Putin ser um coronel da KGB, muitas vezes ligamos a sua visão como a de alguém sempre voltado à União Soviética, até mesmo para dizer que um dos maiores erros geopolíticos foi a dissolução da URSS. No entanto, existe aí uma questão muito particular: Vladimir Putin tem uma visão contínua da história russa, e a União Soviética foi um período dentro da história russa com uma característica política específica. Mas o ponto principal aqui, que dentro da ideologia eurasiana que hoje tem em Alexandr Dugin um grande promotor, com suas ideias dentro do Kremlin, é que se considera o mapa da União Soviética de 1939 as Fronteiras do Império Russo, e que é a eles que elas se devem.
Um outro fator que se evidencia quando tiramos esse véu simples da União Soviética (apesar de ele não ser simples) é a questão envolvendo o lado teológico, que é algo de que poucas pessoas falam aqui no Ocidente. Em todas as declarações de Vladimir Putin desde o dia 22 de fevereiro, dois dias antes de invadir, ele fala das questões culturais e, principalmente, espirituais, e aqui temos um ponto muito importante a se entender, porque ele está falando estritamente da questão teológica que envolve os dois países. Tanto Vladimir Putin como Alexandr Lukashenko [presidente da Bielorrússia] já deram declarações recentes falando que a Ucrânia tem que voltar à sua realidade espiritual, que seria a Igreja Ortodoxa, e não a comunhão com a Igreja católica Apostólica Romana.
Isso nos obriga a voltar a um ponto muito importante da História, que é o grande Cisma da Igreja, em 1054, quando houve o cisma entre a Igreja Católica Apostólica Romana e a Igreja Ortodoxa do Oriente, que se manteve em Constantinopla, atual Istambul, até 1452, quando o Império Bizantino cai. Após essa queda, toda a estrutura clerical da Igreja Ortodoxa foi para a atual capital da Ucrânia, Kiev, e em 1472, Ivan III, que era, por assim dizer, o líder daqueles vários principados e ducados da Rus, casa com a sobrinha do último imperador bizantino, e a partir disso ele começa se declarar autocrata e também czar (foi aí que nasceram os czares cursos). Nesse período, a sede principal da Igreja Ortodoxa se desloca de Constantinopla para Kiev, e, depois disso, para a Moscou. Nesse momento, em Moscou, temos cada vez mais o centro do poder da Igreja ligado a todo o Estado clerical, e as eleições episcopais, os patriarcas, tudo ali vai ser indicado pelos bispos russos. A Igreja Ortodoxa Russa começa a ter a sua independência, e, a partir disso, ela serve também como um aglutinador da identidade nacional russa, que viria a ser criada no Império Russo, no século seguinte, ali na primeira metade do século XVI. Temos aí a formação não só da identidade nacional, do Império Russo e dos czares; nessa mesma época nasce o conceito de Moscou como Terceira Roma: Roma seria a primeira; Constantinopla, capital do Império Bizantino, seria segunda; e, depois disso, com esse poder subindo para Moscou, a Terceira Roma.
No entanto, há um evento pré-Cisma, que foi a coroação de Carlos Magno como imperador dos romanos, em 8oo, pelo Papa Leão III. Nessa coroação fica reconhecido Carlos Magno como o imperado dos romanos, e o Cisma acontece 254 anos depois. E 600 anos depois, Ivan III coloca Moscou como a Terceira Roma, e isso acontece até para tentar quebrar uma designação de quem não seria o novo imperador dos romanos — que foi Carlos Magno, indicado pelo próprio Papa antes do Cisma.
Percebe-se aqui como as coisas ficam complicadas. Há questões teológica que vão sendo quebradas para se estabelecer esse conceito da Terceira Roma. Pode parecer, inicialmente, que isso não tem uma ligação muito clara com as ações de Putin, mas quando analisamos todo seu discurso eurasianista, principalmente nas questões teológicas e espirituais, para justificar tais ações, encontramos aí Moscou, a Terceira Roma, que vai, segundo o próprio discurso eurasiano, varrer do Ocidente o Anticristo (o próprio Dugin já tem falado isso).
Aí temos uma confusão muito grande: cada vez mais pessoas acham que os eurasianos vão salvar o Ocidente, quando na verdade eles querem eliminar o Ocidente. O Dugin, no domingo passado (14), disse que agora esta é a nova composição do mundo: a união entre ortodoxos e islâmicos para acabar com o Anticristo do Ocidente. E obviamente, quando ele diz o Anticristo do Ocidente, está se referindo à Cátedra de Pedro, ao Papado – não necessariamente o Papa Francisco, mas o papado em si. No próprio século 16 existia uma intenção de acabar com os papistas polacos, essa já era uma intenção clara dentro do Império Russo naquele século, porque eles ocupavam ali uma boa parte do que hoje é o oeste da Ucrânia, onde está a região de Liviv, por exemplo, que acaba de receber a imagem peregrina de nossa Senhora de Fátima – e após eles receberem essa imagem, os russos começaram a bombardear a cidade.
Portanto, temos aqui questões que vão muito além do que se tem colocado agora, de maneira simplista, sobre a OTAN, por exemplo. Não é essa questão, assim como não se justifica a questão de se existe ou não a identidade nacional ucraniana. Putin, por exemplo, usa o argumento do idioma para falar da autodeterminação dos povos, e de que todos são russos porque falam russo. Mas se a Ucrânia, pegando esse mesmo argumento, tem o seu próprio idioma, que não é o russo, isso também não seria um fator de autodeterminação? Ou seja, percebemos que a narrativa histórica vai sendo utilizada sempre a favor da Rússia quando isso é favorável ao Kremlin. Por isso, Putin jamais menciona o Holodomor, que foi grande genocídio do povo ucraniano nos anos 30 do século XX.
Revista Esmeril: Você mencionou Alexandr Dugin algumas vezes, e sabemos que ele é uma figura fundamental nas ações de Putin, ignorada pela grande mídia. Gostaria que falasse um pouco mais sobre o papel de Dugin nas ações e jogadas do czar vermelho.
Paulo Henrique Araújo: Dugin é um personagem central ignorado por boa parte das pessoas, e muitos que estão trabalhando para comentar este conflito tendem a reduzir sua importância. Dugin serve como o elemento aglutinador, e justamente com ideologias que vão sendo implementadas em várias vertentes, com a sua Quarta Teoria Política, em que há diversos aspectos de várias ideologias, e ele acredita que cada uma dessas ideologias tem pontos positivos que devem ser utilizados. Isso, aqui, de maneira obviamente bem simplista.
Mas o grande ponto é que Alexander Dugin é um perenialista, e a partir disso ele cria algo como uma religião tradicional, que na verdade é uma grande mistura. Ele utiliza tanto os islâmicos que estão ali, né, ao sul da parte asiática da Rússia, quanto os cristãos ligados à Igreja Ortodoxa, num sincretismo religioso, e faz esse apelo à tradição. Pega valores que são comuns a cada uma dessas religiões e coloca isso com um aspecto ligado à tradição e ao simbolismo.
Hoje em dia, por exemplo, estamos observando várias ações no Ocidente, em que há uma corrosão da sociedade ocidental, que vive sua corrosão no campo moral por várias ideologias, entre outras coisas. Só que isso não é o Ocidente, isso está acontecendo no Ocidente. E Alexander Dugin faz uma simplificação em seus discursos e nos seus escritos, com seus pupilos, que são muitos aqui no Ocidente e ele sempre cria uma caricatura de um espontâneo dialético do que é o Ocidente. Por exemplo, ele pega imagens de soldados ou até oficiais trans em alguns exércitos, como o da OTAN, e coloca: “Aqui estão os soldados do Ocidente”. Ele cria essa simplificação quando, na verdade, isso não representa o Ocidente, mas um problema que há no Ocidente. E ele sempre apela à destruição moral do Ocidente, falando que o Ocidente está tomado pelo aspecto liberal, como se isso fosse um problema único exclusivo do Ocidente, como se o resumisse. Ou seja, a civilização ocidental não está mais ligada à moral cristã, não está ligada à filosofia grega, está simplesmente reduzida a essa degradação. Isso constitui uma inverdade, uma simplificação barata, mas serve comprar argumentos para pessoas que estão cansadas do que vem acontecendo.
É óbvio que as ideias do Putin são muito mais que isso, mas aqui eu estou trazendo algumas observações específicas do que está sendo utilizado neste momento. Então, através desse apelo, ele sempre coloca alguns discursos – nós temos vários discursos do Putin recortados com essas ideias – apontando problemas que nós temos no Ocidente, mas perceba que ele nunca fala de soluções, e ele nunca diz, em momento algum, que está querendo salvar o Ocidente como muitos acreditam. Esse é um problema muito sério, porque a civilização ocidental, hoje, já não tem mais um senso de continuidade histórica em boa parte das pessoas, e elas não conseguem observar o que é a civilização ocidental, quais são os nossos valores, e sobre aquilo que jamais teve a participação da Rússia, principalmente em sua formação histórica, que sempre foi fechada. A Rússia sempre foi um estado autocrata, centralizador, desde Ivan III, e depois com o seu filho, Ivan, o Terrível, e com todos os outros czares que vieram depois. Com a Dinastia Romanov, a partir do século XVII, e até o fim dela, no século XX, e depois durante todo o período da União Soviética. O mais próximo que pudemos observar de uma democracia dentro da Rússia é esse simulacro que há hoje, através da Duma, uma “maquiagem” que a Rússia usou na criação desse simulacro para conseguir ter uma conexão com o Ocidente. Porém, essa Rússia que sinaliza virtudes na luta contra a agenda LGBT, a na verdade tem os seus próprios problemas, e que são tão trágicos ou até piores: uma epidemia de alcoolismo; é o país que mais aborta no mundo; dentro da Rússia, há diversos problemas envolvendo a violência doméstica, algo que faz parte, inclusive, da cultura russa – é algo comum e natural, de certa forma tradicional, na Rússia, os maridos espancarem as mulheres, e isso é algo muito comum até mesmo na literatura. É óbvio que não estou dizendo que todos os russos espancam suas esposas, que todos os russos são beberrões, ou que todas as mulheres russas praticam o aborto, mas existe uma alta incidência desses problemas de decadência moral na Rússia, que é pintada como “tradicional” pelo Dugin em sua propaganda para o Ocidente.
Agora, o papel de Dugin junto ao Putin é justamente dar o pretexto histórico para suas ações através dessa ideologia. A grande intenção por trás dessa alta cúpula, desse alto círculo dentro do da Rússia, é um fator que congregue esse senso aglutinador do poder. Quando olhamos para a queda da União Soviética, verificamos que Gorbatchov já estava num processo em que não se acreditava mais naquela superestrutura da forma como era apresentada. A URRS, o alto controle que existia, e ele queria mudar esses caminhos. Começou a fazer essa alteração, só que uma boa parte do poder soviético não estava contente com isso, principalmente a alta cúpula da KGB. Houve naquele momento uma grande divisão em cima disso. Com a dissolução da União Soviética, a Rússia fica como a responsável; trazendo para realidade Brasileira, o CNPJ responsável por tudo, inclusive por todo o aparato militar que existia. E Alexander Dugin, desde os anos 80, já vem se infiltrando e promovendo várias ideologias dentro da Rússia. Ele começa a utilizar a Igreja Ortodoxa também como um espantalho ou enquadrador para uma determinada fatia da sociedade ligada à teologia; vai também ter com os comunistas dentro da Rússia, com os bolcheviques à direita, com os círculos nazistas, e vai aglutinando tudo isso em torno dessa Quarta Teoria do Poder Político, em que ele faz um amálgama de várias questões que envolvem desde teologia, tradicionalismo, falso cristianismo (que é utilizado como propaganda para o Ocidente), e ele congrega tudo isso e vai aglutinando todas as diferenças e matizes que há ali na Rússia, para enfrentar os “atlantistas”, os “homens dos mares”, como ele gosta de dizer, porque eles (eurasianos) são o Império terrestre, o Império dos exércitos terrestres. Ele vai traçando toda essa divisão ideológica, e sempre traz isso como a grande desculpa, o grande pretexto para as ações de Vladimir Putin.
Não quero aqui reduzir numa resposta o que é a mentalidade de Alexandr Dugin, o que é sua filosofia, o que ele propõe, mas, de maneira geral, ele fala sempre contra o Ocidente, sempre contra os “males do Ocidente”. E o que chama atenção, em linhas gerais, é que ele utiliza a maioria dos pensadores revolucionários, os filósofos revolucionários, das filosofias e ideologias revolucionárias do Ocidente para justificar a sua cruzada antiocidental. Isso é muito peculiar. Inclusive, ele tem dado entrevistas dizendo que existem dois Vladimir Putin no momento: o Putin lunar, que é um Putin que coopera com a agenda ambientalista, Agenda 20/30 da ONU, que fala das questões identitárias, etc., e há o Putin solar, que é esse Putin que fala das questões “nacionalistas”, o Putin imperialista com as intenções eurasianas.
Eu e o Sr. Sepúlveda [José Carlos Sepúlveda] fizemos uma análise na quarta-feira passada (9), sobre as falas do Alexander Dugin nesse sentido, e, segundo ele [Sepúlveda], hoje Putin é “hiperssolar”. Mas nessa própria afirmação percebemos algo muito basilar da filosofia marxista, a dialética: uma mesma coisa pode significar duas outras ou mais, mais, e ambas são válidas para o debate. Então, ao mesmo tempo em que Putin coopera com os líderes globalistas e trabalha pela pauta globalista, também luta contra tudo isso, e as duas formas de atuação são válidas. Isso é a própria dialética marxista sendo aplicada por Putin.
Revista Esmeril: O PHVox desde sempre alerta e faz análises sobre questões envolvendo as várias nuances do que se convencionou chamar de Nova Ordem Mundial: as ações de Putin, coordenadas com seus aliados, estão revelando que estamos, neste exato momento, testemunhando lances decisivos para uma reconfiguração geopolítica mundial própria de uma nova ordem mundial?
Paulo Henrique Araújo: Pode-se dizer que sim, mas é importante entender o que que de fato é Nova Ordem Mundial, pois existe uma confusão muito grande em torno desse conceito. Muitas pessoas tratam a Nova Ordem Mundial como um ente, algo organizado em torno de um núcleo a partir do qual ela será implementada.
Dentro dessa confusão, muitas pessoas dizem que a Nova Ordem Mundial são os globalistas, chamam a Nova Ordem Mundial da “a NOM”, mas o que seria “a NOM”? Uma ideologia? Não necessariamente. Então, é importante entender o que é a Nova Ordem Mundial: é uma nova organização, uma nova ordenação do mundo em seus mais variados aspectos, como o mundo vai ser configurado e regido.
Aí voltamos a apontar Alexandr Dugin, que disse que agora o mundo vai ser o multipolar, teremos multipolaridades entre as nações do mundo, e isso seria já um projeto de uma nova ordem mundial. Não precede, portanto, a ideia de que Putin estaria lutando contra a Nova Ordem Mundial, quando na verdade ele está tentando avançar com a sua própria visão de Nova Ordem Mundial. Ou seja, são duas forças revolucionárias, um conjunto de forças revolucionárias, lutando cada qual para implementar a sua nova hegemonia, para implementar qual vai ser a agenda que vai avançar com o processo revolucionário. Isto é importante entender: todas essas forças, seja a Rússia com seu imperialismo oriental, ou o globalismo ocidental, com seus grupos de altos círculos de poder que se utilizam dos Estados nacionais para a implementação de suas agendas, eles não necessariamente são inimigos, mas cooperam entre si em várias pautas, e agora estão em um embate para definir qual das suas agendas vai lograr êxito, qual vai conduzir o processo revolucionário a partir de então.
Dentro desse contexto, podemos, sim, afirmar que Vladimir Putin está trabalhando pela hegemonia da sua pauta revolucionária, da ordenação do mundo segundo a sua visão de nova ordem mundial.
Revista Esmeril: A Editora PHVox acabou de, fortuitamente, lançar em livro um artigo do Dr. Plínio Corrêa de Oliveira sobre a corrupção da linguagem como arma de propaganda comunista, e essa questão me fez lembrar de duas coisas interessantes que têm acontecido particularmente no Brasil: uma grande mídia tentando direcionar as massas contra Putin, e, por outro lado, muitas pessoas, sobretudo entre a dita “direita”, apoiando o ditador russo, que veem como um autêntico conservador. Você enxerga, em ambos os casos, ações de manipulação das massas com base em estratégias de propaganda comunista?
Paulo Henrique Araújo: Esse livro do Dr. Plínio Corrêa de Oliveira é sensacional para este momento que nós estamos vivendo. Vou começar pela última parte da sua pergunta: por que tantas pessoas estão simplesmente se deixando levar pelo discurso de Putin, das ideias de Alexandr Dugin sem nem mesmo saber quem ele? Isso trata exatamente da baldeação ideológica inadvertida, e essa baldeação ideológica não esperada acontece justamente pela corrupção da linguagem, pela subversão do significado das palavras por termos talismãs, em um processo em que esses termos são esticados ao máximo, e neles vão sendo colocados vários sentidos, vários significados.
Essa obra do Dr. Plínio mostra justamente como isso é feito: revela como é feita essa baldeação ideológica, de maneira que a pessoa que é vítima desse processo de baldeação nem percebe, ela entra muitas vezes no estágio de paralaxe cognitiva sem ao mesmo perceber. Pessoas, por exemplo, até tempo atrás estavam militando contra o comunismo, hoje já relativizam que o grande líder da Rússia seja um agente da KGB, que a atual oligarquia russa está ligada à KGB. Tudo isso vai sendo ignorado por conta de algum algumas coqueluches linguísticas, como “conservador” e “cristão”, em referência a Putin, que não traz nada disso em profundidade. Afinal, como é possível que um conservador cristão esteja com mais de 16000 muçulmanos sendo enviados como mercenários contratados para matar cristãos dentro da Ucrânia? Aí, a pessoa vítima dessa baldeação ideológica já recorre rapidamente a justificativas com palavras talismãs: “é porque eles são globalistas!” Ou seja, se Putin quiser invadir o Brasil, ele também poderia fazer isso segundo a justificativa dessas pessoas – afinal, o Brasil não tem adotado várias pautas da agenda globalista? Há aí uma simplificação brutal da realidade, em que as pessoas confundem o que é a profundidade de uma nação, sua cultura, valores etc., com uma elite de mais ou menos 200 ou 300 famílias que controlam muito dos destinos do mundo todo – e não é só do Ocidente ou do Oriente. Mas é muito prazeroso pensar de maneira simplista, apontar para “os globalistas” sem conseguir ao menos nomear quem são os globalistas, o que é o globalismo etc.
Esse processo é proposital e planejado, é o que é chamado já dentro das linhas de pensamento da Rússia, dos documentos de analistas militares estrategistas políticos russos vimos acompanhando, de caos estruturado. Cria-se um caos e, a partir das ruínas desse caos, estabelece-se um processo de normatização, algo que já foi previsto e descrito por Yuri Bezmenov, que indica o passo a passo de como se faz a subversão cultural de uma nação para tomar o poder a partir disso. Esse é um dos estágios avançados do que Bezmenov apresenta, ele que era um agente de subversão cultural da URSS, e que acabou desertando.
Agora, há este outro ponto importante, quando verificamos que existe também uma corrupção das provas por parte dos próprios veículos da grande mídia para pintar o Putin como “o malvadão” e, logo, se a mídia está fazendo isso, então o Putin é “bonzinho”, pois esta também não é uma realidade. Sim, existe uma orientação editorial por parte da mídia justamente porque ela está ligada sobretudo ao Clube de Bilderberg, a maioria das agências de notícias do mundo está ligada a uma pequena elite que controla os meios midiáticos. Mas o fato de eles terem intenções secundárias para derrubar Vladimir Putin (pois eles são agentes dessa guerra de superfície entre as duas faces revolucionárias, que cooperam nas profundidades e neste momento estão tendo um choque superficial, e dentro disso o povo ucraniano que é a maior vítima), não necessariamente significa que tudo o que está sendo dito a respeito de Vladimir Putin é errado. Ele é sim um autocrata, encara-se como uma espécie de czar e está tomando atitudes de um megalomaníaco.
Também não podemos olhar o eurasianismo com o olhar ocidental, isso seria desonestidade intelectual, mas o que Vladimir Putin quer hoje é a destruição da civilização ocidental, e a civilização ocidental não é o progressismo, nem é o marxismo identitário. Aliás, muitas pessoas esquecem que essas bases que foram utilizadas aqui para subverter para a sociedade vieram também da União Soviética, só que existe novamente um fio condutor histórico que traz tudo isso, e esse fio condutor é a explosão revolucionária do homem. E aqui, para tentarmos encontrar um ponto de início desse processo, podemos apontar o próprio grande Cisma de 1054, que comentei acima. Ainda, se observarmos o período pós-Revolução Francesa, veremos que muito do que hoje o Alexandr Dugin coloca como bases para enfrentar o liberalismo político do Ocidente, que precisa ser destruído, que é onde está o Anticristo, entre outras coisas, também é a base do que foi utilizado para criar sua ideologia, é o que está pautando o eurasianismo.
Portanto, não necessariamente o inimigo do meu inimigo é meu amigo nesse caso, porque nós estamos falando de duas frentes que querem a destruição do Ocidente, de duas frentes que querem a destruição daquilo que é um eixo basilar da nossa civilização, que é o cristianismo, e na sua vertente principal, na sua principal raiz doutrinária, que é a Igreja Católica Apostólica Romana. E não se trata aqui questão de falarmos, “olha, mas temos outros cristãos, nós temos os protestantes, os reformados etc.”, pois essas vertentes cristãs situam-se 500 anos após a questão do Cisma, e o que está aqui em jogo é a questão do Cisma, que é um ponto central nesse debate, do que está acontecendo nesse jogo de poder.
Há vários aspectos nesse jogo, e podemos falar de outros altos círculos, como os maçônicos, que também controlam e também querem a destruição desses valores. A própria Revolução Francesa já é a negação de Cristo, a negação completa de Deus, do Espírito Santo. Quando falamos dessa explosão revolucionária, ambos os lados querem a destruição daquilo que nós conhecemos como a estrutura do Ocidente, a estrutura da nossa moral, da nossa civilização. Sejam os globalistas, seja o próprio cientificismo que eles aplicam, que também é praticado pela China e pela Rússia, sejam os eurasianos. Cada um está jogando com as armas de propaganda que tem. Então, a mídia, sim, pinta Vladimir Putin como um vilão e, sim, Vladimir Putin é um grande vilão, assim como no Ocidente nós temos essas figuras que controlam muitos dos meios de ação que utilizam figuras políticas como “puppets”, como bonecos de ventríloquo, como o próprio Joe Biden, o Emmanuel Macron, entre tantos outros. Mas é este o ponto central: existe toda uma estrutura de propaganda por trás de tudo isso, e existe a realidade, e a realidade mostra que de ambos os lados existem problemas, e no meio de tudo isso está a nossa civilização, alvo de uma tentativa de destruição
Revista Esmeril: E já que mencionamos o Dr. Plínio Corrêa de Oliveira, gostaria de encerar nossa conversa tratando da questão espiritual que envolve a Rússia: o “fenômeno” Vladimir Putin e suas consequências globais constitui sinal evidente da profecia de Nossa Senhora em Fátima sobre os erros da Rússia que se espalhariam pelo mundo? Ainda: o que podemos esperar da Rússia ao Imaculado Coração de Maria, a ser realizada na próxima sexta-feira (25) Isso poderá trazer algum alívio para as tensões mundiais?
Paulo Henrique Araújo: Essa é uma questão muito interessante, e eu vou começar a resposta novamente pelo final. Nós teremos a consagração da Rússia e da Ucrânia ao Imaculado Coração de Maria, de Nossa Mãe Santíssima, e não há como nós dizermos se esse evento terá ou não alguma validade, até porque é um momento que exige prudência, e nós, como leigos, devemos observar aquilo que vai acontecer sem tentar prever os desígnios da Providência. Podemos até incorrer em erros gravíssimos enquanto leigos. Então, acredito que nós precisamos aguardar e verificar como vai ser feita a consagração, e a partir disso ter uma visão mais clara dos acontecimentos. Precisamos ter calma e confiar na Providência, nos desígnios e na vontade de Nosso Senhor Jesus Cristo e na intercessão de Nossa Senhora para que isso aconteça. Mas, sendo a consagração exatamente como pedido e orientado por nossa Senhora de Fátima aos três pastorinhos de Fátima ou não, será uma consagração não é muito poderosa e abençoada.
Agora, voltando ao primeiro ponto da pergunta, o que chama atenção é como tudo o que envolve a maior de principal aparição de Nossa Senhora ao longo de toda a História da cristandade é Fátima. A aparição de nossa Senhora em Fátima sempre suscita a atenção até mesmo daqueles que não são católicos, daqueles que sequer acreditam em Deus. Quando nós temos uma situação como essa, as pessoas sempre remetem a Fátima e à sua importância. E dentro da própria Rússia nós temos não é uma preocupação muito grande com isso. Na União Soviética já existia uma perseguição daqueles que falavam sobre Fátima, proibição de falar sobre a aparição de nossa Senhora em Fátima. Nos anos 90, após a queda da URSS, na Rússia houve uma abertura maior em relação a isso, mas quando eu Putin chegou a poder, ali no final do século XX para século XXI, voltou a haver uma perseguição muito forte em relação à aparição de Fátima. Até mesmo as pessoas poderiam viajar até Fátima teriam que ter muito bem declarada qual era sua intenção para tirar autorização do governo para poder fazer a viagem.
E temos aqui algo incrível: estamos vivendo uma guerra, e finalmente a questão teológica começa a vir à baila de uma maneira mais específica, e Fátima vira o centro de toda essa discussão. Não há como não ficarmos emocionados com a chegada da imagem peregrina de nossa Senhora de Fátima na cidade de Liviv, por exemplo. Foi algo esplendoroso, bonito, e foi algo poderoso. Isso com certeza abala muitas estruturas e incomoda muito o alto escalão do poder russo, muito mais do que só o Vladimir Putin e o próprio o Alexandr Dugin, entre outras figuras ali em torno, porque isso dá um senso de aglutinação, também, e mostra a importância de Nossa Senhora e dessa aparição, de como que ela vem suscitando o debate, a curiosidade. Veja: só o fato de o Papa falar que iria fazer a consagração da Rússia e da Ucrânia ao Imaculado Coração de Nossa Senhora, de Nossa Mãe Santíssima, como isso despertou um debate profundo no mundo inteiro. O mundo inteiro está aguardando essa consagração, o mundo inteiro está aguardando que seja cumprida a solicitação de Nossa Senhora. Percebe o quanto isso é poderoso? Esse deve ser o ponto principal de nossa atenção. E, novamente, existe um conflito ali no battle ground, no terreno, existe, mas também há aí numa guerra civilizacional, de valores culturais, e aquilo que precede a cultura é a religião, é a nossa fé, aquilo que baliza a moral do Ocidente, a fé cristã. Enfim, estamos passando por um processo de guerra civilizacional, que tem um aspecto em profundidade de fé muito grande, e Nossa Senhora, neste momento, mostra a importância desse aspecto que muitos tentam esconder e empurrar para debaixo do tapete.
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Kireyev era uma personalidade relevante no Ministério das Finanças, onde alcançou o cargo de vice-diretor geral. Trabalhou posteriormente para uma empresa austríaca e, de 2006 a 2012 foi membro do Conselho Fiscal do Banco Ukreximbank. De 2010 a 2014 fez parte da administração de um outro banco, o Oschadbank, como vice-presidente. A notícia da sua execução, não confirmada até agora por fontes oficiais, surge na imprensa ucraniana, especificamente no Obrozevatel, que informou sobre escutas telefônicas na origem da descoberta de contatos entre Kireyev e a Rússia. Kireyev, que se incluía na delegação ucraniana para as conversações da Bielorrússia desapareceu entretanto das fotos e das listas que surgiram sobre a composição da equipe.
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