Edição XLII (Terça Livre, Revista A Verdade 74, Revista Esmeril 28, Opinião e mais)

Tempo de Leitura XLII

(Opinião, artigos e cultura para pessoas livres)


Resumo semanal de conteúdo com artigos selecionados, de foco na área cultural (mas não necessariamente apenas), publicados na Revista A Verdade, na Revista Esmeril e outras publicações de outras fontes à minha escolha. Nenhum texto aqui pertence a mim (exceto onde menciono), todos são de autoria dos citados abaixo, porém, tudo que eu postar aqui reflete naturalmente a minha opinião pessoal sobre o mundo.


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LEITURA RECOMENDADA

Minhas redes:
     

1 de Fevereiro de 2022
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👆 Com a palavra, Terça Livre!




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MEMÓRIA TERÇA LIVRE
(matérias de edições antigas da revista que ainda são atuais)


Hoje voltaremos no tempo para a edição 11 da Revista Terça Livre, de 24 de Setembro de 2019.

Infelizmente não é mais possível acessá-la porque o site TL TV saiu do ar, portanto agora uso do meu acervo de pdfs para publicar artigos da revista. Porém, a área de cursos do Terça Livre se encontra disponível novamente através da plataforma do Canal Hipócritas.



COMPORTAMENTO


👆 Jornalismo brasileiro está corrompido em sua essência
(por Priscila Dalcim)



Como o pensamento de esquerda tornou-se hegemônico entre os formadores de opinião

Mentiras, trapaças, distorções e desonestidade: estas são as armas utilizadas pela tradicional mídia brasileira contra o governo Bolsonaro, que venceu as eleições, em meio a uma guerra declarada, quase sem apoio da grande imprensa. Praticamente toda tomada pelo pensamento de esquerda, a mídia mainstream instrumentaliza o ofício da informação utilizando-o como arma de ataque a terceiros e, inescrupulosa, prejudica a vida de 210 milhões de brasileiros.

Ideologizada, a classe jornalística parece ter se tornado destituída da capacidade de pensar diante da verdade dos fatos, o que qualquer iniciante na área de comunicação sabe que, por si só, são intrinsecamente irrefutáveis. Na realidade, é ativado nesses jornalistas um mecanismo de defesa de negação psicológica, sob o qual passam a rejeitar o óbvio e proclamar aquilo em que desejam crer. “Chegará o dia em que teremos que provar ao mundo que a grama é verde”, já disse o escritor e filósofo inglês, G. K. Chesterton.

O curioso é que a negação psicológica só é desencadeada diante de uma iminente situação de grande sofrimento ou desprazer psíquico que venha a oferecer o risco da promoção de uma instabilidade do consciente, como por exemplo, a morte de uma pessoa amada. No entanto, essa reação torna-se presente e ativa quando esses profissionais deparam-se com situações que não se alinham às crenças fundantes da ideologia que seguem: o socialismo e seus diversos braços.

Para escapar da verdade que diverge daquilo em que querem acreditar e disseminar, adotam a relativização dos fatos. Ou seja, aquilo que é, deixa de ser, se assim eles o quiserem. Perdendo quaisquer limites de
moralidade, deixaram de lado o papel da imprensa como grande auxiliadora na construção de uma sociedade sadia e próspera, passando a propagar discursos infundados, abjetos e destoantes da realidade. “A grande
mídia é uma facção criminosa”, diz o psiquiatra Ítalo Marsilli. “É uma mentirada do início ao fim. Nada, absolutamente nada do que você leia na mídia sobre os fatos políticos corresponde à realidade”, afirma.

Aliás, o próprio código de ética dos jornalistas brasileiros, em seu artigo segundo, direciona-os a trabalharem pela verdade: “a divulgação da informação, precisa e correta, é dever dos meios de divulgação
pública, independente da natureza de sua propriedade”. E no artigo terceiro, complementa: “a informação divulgada pelos meios de comunicação pública se pautará pela real ocorrência dos fatos”.

Mas a conduta dos profissionais de comunicação da grande mídia no Brasil destoa completamente dos fatos, da busca pela máxima isenção – posto que não é possível alcançá-la plenamente, fere não só o código de ética da classe, mas também a vida, a reputação e os
negócios das pessoas.

Diante dessa conduta antiética, a imprensa brasileira já não inspira mais confiança a qualquer cidadão comum, quiçá naqueles que possuem um conhecimento aprofundado do cenário sociopolítico e econômico do
país. “A classe jornalística é a maior inimiga do Brasil atualmente”, diz o filósofo Olavo de Carvalho.

Ciente do poder de manipular discursos, ideias e incitar ações fundamentadas em suas mentiras, a grande mídia partiu para a guerra contra o governo Bolsonaro muito antes de sua eleição, quando ele ainda atuava como parlamentar na Câmara dos Deputados, em razão de mostrar-se resistente ao sistema de corrupção e de ideologia implementados. Combatendo frontalmente os braços de ação do socialismo já vigentes no Brasil, Jair Bolsonaro despertou a ira do quarto poder que, com sua conduta imoral, passou a ser conhecida como extrema-imprensa.

A destruição do jornalismo desde os bancos das universidades

O plano de poder que visa a implementação do comunismo no Brasil deu-se há mais de 50 anos. Para tanto, algumas estratégias foram traçadas. Dentre elas, a instrumentalização dos cursos universitários de humanas, prioritariamente das faculdades de artes e de comunicação. Com isso, o jornalismo deixou de ser orientado para a disseminação de notícias e informações em favor do bem comum, e passou a seguir os ideais de Karl Marx, Lênin e Antônio Gramsci.

A razão para isso é simples: os alunos são plateia cativa, que ouvem e absorvem como verdadeiras esponjas aquilo que lhes é passado. Já em fase adulta, possuem a habilidade de análise. No entanto, o conhecimento ofertado pelos professores militantes, que estão ali com o claro objetivo de ideologizá-los, é formado por opções dentro do mesmo sistema ideológico.

Na Universidade Federal Fluminense (UFF), localizada no estado do Rio de Janeiro, os alunos de comunicação social têm aula com o professor Felipe Pena vestido de saia longa, em uma provável tentativa de disseminar os conceitos da ideologia de gênero. A teoria prega que tanto o homem quanto a mulher têm o seu sexo – aquilo que eles chamam de gênero – definido por meio da construção social, e não pela condição biológica do indivíduo. Além da teoria já ter sido cientificamente refutada, é inapropriado que um professor propague suas ideologias particulares dentro de sala de aula.

Não obstante a disseminação da infundada teoria, o professor ministra aula de uma disciplina peculiar, jornalismo de resistência. O docente possui um uma página na internet para abordar melhor o tema. Ou seja, são professados dentro de sala de aula os conceitos que fundamentam a mentalidade revolucionária. Eis o que nossos alunos de jornalismo estão aprendendo nos bancos das universidades públicas: de que maneira podem atuar como os braços de uma revolução, de preferência comunista, por meio da área de comunicação, ainda que não o façam plenamente conscientes daquilo com que estarão colaborando. Essa é a razão de o jornalismo brasileiro estar contaminado pela ideologia revolucionária.

Com a mente aberta e pronta para absorver como esponja todos os conhecimentos que lhes são ofertados, os jornalistas assimilam e adotam aquela cultura quase que de imediato, tornando-se verdadeiros militantes e, muitas vezes, sequer percebem que foram lançados nessa arena tendo sua liberdade de escolha aviltada.

Com a ideologia entranhada em suas ideias, não assimilam a possibilidade de existência de outros valores, aqueles que regem a sociedade em sua maior parte, e levantam-se com ferocidade contra aqueles que se recusam a coadunar com a mentalidade revolucionária. Assim aconteceu com Bolsonaro e, por mais que ele promova ações benéficas para o país, é diariamente atacado pela mídia. “Essa semana foram sete matérias falando mal de mim nessa revista Época, nenhuma a respeito do meu trabalho”, disse Bolsonaro.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, reflete sobre o cego posicionamento dos jornalistas, que não conseguem lidar com o contraditório e atacam impiedosamente quem deles discordam. “Ele (o presidente) apanha o dia inteiro. Você não abre um jornal que não esteja batendo nele da primeira até a última página. ‘Porque ele fala coisas que não concordo’ (diz o jornalista). Tudo bem, a opinião dele, ele tem o direito. E aí? Só é bonito defender o outro lado?”.

Foi-se o tempo em que o jornalismo brasileiro era motivado pela busca da verdade dos fatos. Imoral e trapaceira, a classe jornalística corrói a opinião pública com suas mentiras engendradas, além de envergonhar os profissionais sérios que entregam suas vidas para viverem pela verdade. Apesar disso, em um país onde o governo elegeu-se tendo a verdade como base, eis um sinal de que ela ainda tornar-se-á a base, não só do jornalismo, mas também desta nação.

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SOCIEDADE



👆 Geração Geleia: Universidade britânica considera o livro 1984, de George Orwell, ‘ofensivo e perturbador’ para os alunos
(da Redação)


É ofensivo e perturbador ler distopias que se aproximam cada vez mais da nossa realidade. Uma geração altamente sensível e avessa à verdade estaria ‘perturbada’ por causa do Orwell. 

A universidade britânica de Northampton emitiu um alerta de gatilho referindo-se ao romance 1984, de George Orwell, para os alunos do módulo “Identidade em construção.” Os estudantes são avisados de que o módulo “aborda questões desafiadoras relacionadas à violência, gênero, sexualidade, classe, raça, abusos, abuso sexual, ideias políticas e linguagem ofensiva”, de acordo com o jornal Daily Mail.

Além do livro de Orwell, os acadêmicos identificam vários trabalhos que têm o potencial de serem ‘ofensivos e perturbadores’, incluindo a peça Endgame, de Samuel Beckett, o quadrinho V de Vingança, de Alan Moore e David Lloyd, e Sexing The Cherry, de Jeanette Winterson.


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TECNOLOGIA

👆 Bilionário Jeff Bezos investe milhões em pesquisas sobre a imortalidade
(por Cândido Neto (Mafinha Summers))





O homem mais rico do mundo jogou mais dinheiro em uma obsessão muito comum entre os bilionários: a busca para derrotar o envelhecimento.  A aposta de Bezos nesta corrida é a Altos Labs, uma jovem e promissora start-up que tenta reverter o envelhecimento reprogramando células humanas.

A start-up está investindo na reprogramação biológica, uma tecnologia que rejuvenesce células em laboratório, e que especialistas acreditam que poderia ajudar a revitalizar corpos inteiros.

A empresa surgiu de uma série de doações para pesquisadores na área da imortalidade.  Quando ficou evidente que uma start-up dedicada e bem financiada poderia realizar pesquisas com mais eficiência, a Altos nasceu e começou a sua busca por todos os cientistas na área de longevidade.

O ganhador do Nobel Shinya Yamanaka, que descobriu a reprogramação celular, concordou em presidir o conselho científico da empresa. O biólogo Juan Carlos Izpisúa Belmonte, que misturou controversamente células humanas em embriões de macacos, está deixando o prestigioso Instituto Salk para ingressar na Altos.  E Steve Horwath, da UCLA, que desenvolveu um "relógio biológico" que mede as mudanças no DNA de uma pessoa e pode prever quanto tempo ela viverá, também está a bordo.

Apesar do pessoal distinto e dos recursos substanciais da Altos, muitas start-ups financiadas já estão desenvolvendo tecnologia de reprogramação celular, incluindo Life Biosciences, Turn Biotechnologies, AgeX Therapeutics e Shift Bioscience.  Nenhuma, no entanto, até agora produziu tratamentos que avançaram para ensaios clínicos em humanos.

O histórico de empresas financiadas por bilionários com metas  para a longevidade humana não é particularmente bom.  Bezos e Thiel apoiaram anteriormente a Unity Biotechnology, que no ano passado falhou em seu primeiro grande estudo, cancelou seu principal programa de antienvelhecimento, demitiu 30% de sua equipe e mudou seu foco para oftalmologia e neurologia.

Enquanto isso, a Calico Labs, subsidiária de ciência da longevidade da Alphabet, ganhou as manchetes em 2013 quando, semelhante à Altos, contratou cientistas de elite e os inundou com enormes orçamentos de pesquisa.  Até agora, a Calico não produziu grandes avanços e dois de seus principais cientistas abandonaram o navio.

Ainda há um longo caminho para se reverter o envelhecimento humano, porém o que antes parecia apenas ficção científica agora já deu um passo na realidade.

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REVISTA ESMERIL - Ed. 26, de 25/12/2021 (Uma publicação cultural digital e mensal de Bruna Torlay. Assinar a revista


PATRIMÔNIO E MEMÓRIA


👆 Entrevista com Rafael Nogueira



(por Leônidas Pellegrini)

ENTRE A HISTÓRIA E AS ESTÓRIAS

Quando nossa editora, Bruna Torlay, anunciou o tema da edição deste mês, imediatamente me lembrei de um trabalho de História que fiz na 5ª série, em 1992. Tínhamos que elaborar um gibi que contasse a história dos bandeirantes. Lembro que o livro didático, primeiro volume da coleção História & Vida, na época não trazia uma demonização muito explícita sobre os bandeirantes, mas, orientado por uma parente professora e marxista, acabei escrevendo um gibi no qual portugueses e mamelucos figuravam como assassinos eviscerando indígenas inocentes com requintes de crueldade, esquartejando curumins no ventre das mães e incendiando aldeias e reduções. O narrador da história, inclusive, era um curumim órfão chamado Jecupé, que havia perdido os pais em uma investida dos cruéis sertanistas. O trabalho, que guardo até hoje, destoava dos demais, em que os coleguinhas desenhavam bravos portugueses, elegantemente trajados, desbravando heroicamente os sertões brasileiros.

Enfim, o gibi do aluno Leônidas recebeu nota 10 com sorrisinho no zero, aquela observação lisonjeira de “Excelente!” e louvores públicos por parte da professora, emocionada. Hoje, três décadas passadas daquela glória literária, vejo meu gibizinho juvenil sendo reproduzido em livros didáticos e trabalhos acadêmicos com todo o rigor científico com que nossos políticos e autoridades sanitárias têm tratado a pandemia da Covid19 – e por isso testemunhamos, entre as recentes ondas alucinadas de destruição de BLMs e afins, o incêndio da estátua de Borba Gato, em São Paulo.  

Mas, afinal, o que houve de lá para cá? A resposta estaria em uma pergunta que poderia ser respondida aqui pelo colega Antonio Fernando Borges: o que há de errado com… a historiografia marxista? Ao que parece, entre tantas narrativas cujos enredos de fato se assemelham a historinhas de gibis, ela trouxe aos nossos dias a versão dos bandeirantes malvadões massacrando puros, inocentes e indefesos indígenas e quilombolas. Trata-se de uma estratégia que, como bem já observou o analista político José Carlos Sapúlveda, misturam-se pedaços de verdade num grosso caldo de mentiras, ao que se serve uma venenosa sopa de falsidades, e a História torna-se uma coleção de estórias de gibi.

É fato que, entre sertanistas, índios, quilombolas e jesuítas, houve histórias e interesses diversos, e, aqui, lá e acolá, entre guerreiros, aventureiros e santos, houve vencedores e vencidos, assassinos e massacrados. Teve de tudo, inclusive heróis. Se nos esforçamos pra entender a história descontaminados de visões anacrônicas e viciadamente ideológicas, talvez consigamos enxergá-la em seus devidos nuances, e, quem sabe, tenhamos patrimônios e almas preservados?

Sobre entradas, bandeiras, bandeirantes, índios, quilombolas, jesuítas e quejandos, conversei com Rafael Nogueira, professor de filosofia, história e literatura, e atual presidente da Biblioteca Nacional. Na entrevista abaixo, Rafael fornece dados, análises e indicações bibliográficas que em muito podem contribuir para sanar visões viciadas – para um lado ou para o outro – desse período fundamental para a formação do território e do povo brasileiros.

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Revista Esmeril: Você poderia definir, de maneira objetiva e sem filtros ideológicos, o que foram as entradas e bandeiras, e como e por que elas tiveram início?

Rafael Nogueira: Se me permite, gostaria de começar a partir do modo como me pede para dar a resposta. Respeito profundamente esse apelo por objetividade e por um afastamento ideal dos filtros ideológicos. E, de fato, posso me comprometer a dar uma resposta sem interesses alheios à missão que considero mais nobre nos estudos históricos — estudar o homem em suas relações com a dimensão do tempo. Mas, assim colocado, não é um pressuposto que se aplica muito bem a outras épocas; tem mais sentido hoje por causa das polêmicas e questionamentos levantados sobre história e memória, sobre a interface entre a história como pesquisa e a história como instrumento que faz uso do passado para fins buscados no presente, ou futuro próximo. Em síntese, peço que encare o meu esforço como uma contribuição pública à compreensão do fenômeno, e não como um pretensioso fim de papo.

“Entradas e bandeiras” é o nome posterior que se deu às expedições luso-tupis dos séculos XVI ao XVIII, que penetraram pelos sertões com origens e fins os mais diversos. O fenômeno histórico é complexo, difícil de compreender, e, portanto, de batizar. Não há palavra-final sobre o tema, ainda hoje.

É tradicional o uso de “entradas” para definir as incursões organizadas pelo governo português e de “bandeiras” para aquelas empreendidas por grupos particulares; mas outros historiadores do século passado defenderam que entradas eram as buscas por metais nobres e bandeiras os esforços militares orientados para guerra e apresamento de nativos. Essa linguagem caducou porque muitas vezes interesses e financiamentos particulares e oficiais se confundiam, bem como as finalidades. Atualmente, reserva-se o termo “entradas” para as expedições fluviais amazônicas a partir de Belém e as de conhecimento de território e minério oriundas do litoral nordestino. Já “bandeiras” se refere aos avanços vicentinos e paulistas (a Capitania de São Paulo se chamou São Vicente até 1688) pelas regiões que chamamos de Sudeste, Sul e Centro-Oeste.

Revista Esmeril: Quem foram, de fato, os bandeirantes?

Rafael Nogueira: Bandeirantes foram os descendentes de portugueses e tupis que desbravaram os sertões do Brasil a partir da Capitania de São Vicente, depois chamada de Capitania de São Paulo. Adotou-se o termo bandeiras posteriormente, porque era hábito chamá-los de vicentinos, paulistas, mamelucos ou maloqueros, nos primeiros séculos de colonização. Quanto à causa, divergem Román Blanco e Capistrano de Abreu: ou era a manutenção de um hábito cruzado, dos exércitos regulares ibéricos, ou costume tupi de levantar estandarte onde chegavam.

Suas motivações eram políticas, econômicas e culturais, às vezes, ao mesmo tempo. Eram políticas quando havia a preocupação de expandir o território para além das fronteiras do Tratado de Tordesilhas; eram econômicas quando buscavam meios de sair da penúria, apelando à violência do apresamento e venda de escravos, e quando procuravam por metais valiosos; e, enfim, eram culturais na medida em que herdavam dessa rede de conexões entre portugueses, espanhóis e tupis ambições, tecnologia, religião.

O espírito aventureiro e colonizador ibérico harmonizava-se perfeitamente com a itinerância e beligerância dos tupis. O bandeirante se deixou moldar pelos banhos, instrumentos, rivalidades e sonhos dos tupis, que pareciam antever a existência de uma unidade territorial com limites estabelecidos pela natureza (a ideia de Ilha-Brasil ou Pindorama). Os indígenas ainda dominavam as trilhas pelas matas, que os portugueses não tinham como fazer surgir do nada.

De Fernão Dias a um Anhanguera II, de um Borba Gato até um Raposo Tavares, todos protagonizaram diferentes tipos de expedições e iniciativas, sendo possível enquadrá-los como uma coisa só — Bandeirantes — apenas por simples didática.

Revista Esmeril: Qual foi a importância dos bandeirantes na formação do território brasileiro e seu desenvolvimento entre os séculos XVII e XVIII?

Rafael Nogueira: A importância é enorme, mas ela pode ser sintetizada pela fórmula do Embaixador Synesio Sampaio: a superação de Tordesilhas.

O mérito só não é exclusivo dos bandeirantes, porque os navegantes precisaram chegar, os diplomatas tiveram que negociar, e os militares têm que defender. Mas foram os bandeirantes que conquistaram o território para além da linha de Tordesilhas.

A linha imaginada foi demarcada em 1494 a 370 léguas a oeste das ilhas de Cabo Verde, o que é de uma imprecisão enorme para os parâmetros da época, ainda mais porque eles não conseguiam delimitar bem longitudes. Aconteceu de variar em 800km o ponto pelo qual passava o meridiano ao norte da América do Sul. Aproveitando-se disso, porque não se tratava de mera ignorância, os bandeirantes penetraram pelos sertões e aumentaram imensamente o desenho do mapa do Portugal da América, avô do Brasil de hoje.

Revista Esmeril: Uma questão bastante cara aos filtros ideológicos a respeito dos bandeirantes relaciona-se à sua atuação em um suposto extermínio de indígenas e quilombolas. O quanto há de fato e o quanto há de narrativa nesta questão?

Rafael Nogueira: A contaminação ideológica não é sempre grosseira e óbvia, apelando a fatos inexistentes e apagando o que anula ou enfraquece suas narrativas políticas. Isso também se faz, e deve ser sempre combatido, desmascarado. Mas existem questões mais sutis, como a ignorância e a incultura, a interpretação anacrônica de dados indiscutíveis, tudo para motivar seus soldados nas lutas presentes, por vezes estimulando violência sob a alegação de combatê-la. 

É incontestável que bandeirantes tiveram participação ativa no enfrentamento bélico de indígenas, na exploração de sua força de trabalho pela escravidão, e na destruição encomendada de quilombos. 

Os bandeirantes, paradoxalmente, povoaram e despovoaram o território, tudo ao mesmo tempo, contribuindo para que desaparecessem vários grupos indígenas, e para que surgissem vilas e povoados que não eram exatamente nem tupis nem portugueses, mas colonizações derivadas que resultavam desse encontro.

Os tupis eram belicosos e alimentavam rivalidades sanguinárias contra outros povos nativos, que, muitas vezes, também mantinham um verdadeiro estado de guerra entre si. Dizer que essa situação conflitiva foi capturada pelos portugueses, para os seus próprios fins, é simplista e exagerado, porque os bandeirantes eram tidos por independentes, desobedientes e intratáveis, mas dizer que os europeus que trouxeram a violência para as praias pacíficas e as selvas paradisíacas destas terras inocentes é bem pior; é crer cegamente no bom selvagem de Rousseau.

A transmissão de doenças, como a gripe, foi o principal fator que levou ao desaparecimento dos povos ameríndios, mas, em segundo lugar, estão a miscigenação e o conflito.

Noutros tempos, eu tinha que me esforçar para persuadir os alunos e ouvintes de que gripe mata povos inteiros. Hoje, estamos suficientemente familiarizados com o perigo das epidemias de gripe, de modo que não é mais preciso detalhar demasiadamente esta parte. A miscigenação começa antes mesmo da chegada de Martim Afonso de Sousa, em 1531, evento que marca o início dos povoamentos. Martim Afonso encontra o Patriarca dos Bandeirantes, João Ramalho, já em terras vicentinas, casado e com filhos mamelucos. Os casamentos interculturais se tornariam comuns em São Paulo, e as gerações seguintes ficariam marcadas por isso, uma vez que o descendente deste elo não é mais nem uma coisa, nem outra. Já o choque interminável entre tribos, continuado na forma de enfrentamento entre o nativo agressivo (ou, como diziam, índio bravo) e o bandeirante (grupo formado por portugueses, tupis e mestiços), vai sendo vencido cada vez mais por este último.

Faz sentido esquecer que os indígenas viviam em guerra permanente uns contra os outros? Que os povos que aqui estavam em 1500 exterminaram o povo de Luzia, os botocudos e outros de que nem temos notícia? Que quase todos praticavam abortos, infanticídios, estupros e canibalismo? Ademais, houve vítimas em todos os lados: as primeiras bandeiras foram de retaliação a vilas dizimadas, e bandeirantes também perderam guerras para guaranis e jesuítas armados, e para os chamados emboabas (os “de fora”). 

Incomoda o fato de que bandeirantes foram celebrados, e mereceram notas elogiosas em livros de história e monumentos públicos. É compreensível, mas é preciso levar em conta que a conquista territorial empreendida pelos bandeirantes é um feito épico. Uma das facetas do heroísmo é encarnada pelo bandeirante: com nada se fez muito, e o feito perdura e beneficia gerações até hoje. Seus povoados ficaram, e de vilas passaram a cidades, frequentemente mantendo os nomes de origem (nomes tupis), e foram preservados aspectos culturais compartilhados do Sul ao Acre, de Santos ao Mato Grosso. 
Abominar a crueldade é reação normal de todo cristão, de todo humanista, de toda pessoa sensível aos dramas e direitos dos outros. Tomar a história por mestra, como fazia Plutarco, destacando os feitos heroicos das gerações passadas, para nos inspirarmos nelas procurando manter seus padrões de excelência, exige também o reconhecimento dos males que praticaram, de seus defeitos e excessos, com seriedade mortal. A tolerância, o diálogo, a compaixão, o perdão e a justiça substituem o ódio, a violência, o sadismo, o ressentimento e a vingança.

Fazer de conta que a brutalidade do nosso período colonial era praticada só por uns e não por outros, e, ato contínuo, identificar os maus de outrora com as pessoas vivas que se quer prejudicar, atribuindo-lhes responsabilidades por culpas que não são delas, é uma abominação. Acredito que isso se deva evitar como ao diabo, porque prenuncia um novo tipo de violência.

Revista Esmeril: No mesmo espírito da questão anterior, como foi a relação entre bandeirantes e jesuítas? O quanto nos é trazido de narrativa nesta questão, e o que realmente são fatos?

Rafael Nogueira: A relação com os jesuítas era realmente péssima, não há o que contestar.

Os bandeirantes fundavam vilas nas quais se vivia com alguma liberalidade. Mesmo que levantassem capelas e igrejas, não compartilhavam da frugalidade e do ascetismo praticado e cultivado pelos jesuítas, o que fazia com que muitos indígenas com os quais se mantinha contato pacífico preferissem viver nas vilas e não nas reduções. Outra coisa: as missões jesuíticas eram perfeitas para formar indígenas aptos ao trabalho, de modo que as expedições que buscavam escravos tinham preferência por aqueles já instruídos pelos jesuítas. Por fim, do ponto de vista político, sabemos que os jesuítas e os guaranis estavam formando uma espécie de fortaleza que favoreceria sua própria expansão, o que era prejudicial aos interesses portugueses, uma vez que quase todo jesuíta era espanhol de origem.

A “lenda negra” que faz dos bandeirantes verdadeiros monstros começou com as cartas dos jesuítas, nas quais eles não faziam nenhuma questão de aliviar a barra para o sertanista.

Revista Esmeril: Para finalizar, quais indicações você teria a dar aos leitores de todas as idades que queiram se informar a respeito das entradas e bandeiras sem tantos filtros ideológicos?

Rafael Nogueira: Há muitas obras de valor publicadas. Não creio que ninguém tenha se aproximado de pôr um ponto final no tema, mas para começar essa expedição pela história, recomendo:

  • Capítulos da história colonial, de Capistrano de Abreu;
  • Las “Bandeiras“, de Ricardo Román Blanco;
  • Memória para a História da Capitania de São Vicente, de Frei Gaspar da Madre de Deus;
  • Nobiliarchia paulistana histórica e genealógica, de Pedro Taques;
  • História das bandeiras paulistas, de Affonso Taunay.;
  • Histórias do Brasil, de José Honório Rodrigues e de Hélio Vianna, onde há boas passagens sobre o assunto;
  • E o meu favorito entre os mais recentes, que é o do Embaixador Synesio Sampaio Goes Monteiro: Navegantes, bandeirantes, diplomatas.

Esmeril Editora e Cultura. Todos os direitos reservados. 2021

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Esmeril, conteúdo gratuito de 25 a 28 de Janeiro



ESMERIL NEWS | DOSE DE FÉ






👆 Tomás de Aquino
(por Leônidas Pellegrini - 28/01/2022)


Doutor da Igreja, São Tomás de Aquino sintetizou a filosofia medieval em sua Suma Teológica

Hoje é dia de São Tomás de Aquino, sacerdote e Doutor da Igreja.

Nascido em 1225, em Roccassecca, na Itália, provinha de uma família nobre, que lhe proporcionou ótima formação. Em 1244, terminados seus estudos de artes liberais em Nápoles, ingressou na Ordem Dominicana, contra a vontade dos pais. Quando viajava de Nápoles a Paris com o Geral da Ordem, chegou a ser sequestrado por seus irmãos, inconformados com sua opção de vida, e ficou um tempo detido na casa dos pais, mas não se dobrou.

Livre das exigências paternas e fiel à sua vocação, prosseguiu em seus estudos, chegando a ser aluno de Santo Alberto Magno em Colônia. Em Paris, formou-se em Teologia, e depois lecionou em diversas cidades italianas e em Paris durante quase vinte anos. Em 1274, foi convocado pelo Papa Gregório X para participar do Concílio de Lyon, mas adoeceu e morreu durante a viagem, aos 49 anos.

São Tomás de Aquino constituía exemplo de inteligência contemplativa, e deixou inúmeras obras de teologia e filosofia, entre elas a Suma Teológica, que sintetiza a filosofia medieval. Foi canonizado em 1323, e proclamado Doutor da Igreja em 1567. Ficou conhecido como Doutor Angélico e Príncipe da Escolástica.

São Tomás de Aquino, rogai por nós!

 

O prisioneiro

 

Quando ouviu a pregação

de João de São Juliano,

descobriu sua vocação

e quis ser dominicano

 

o jovenzinho Tomás,

que a família contrariou

e indo da pobreza atrás,

praquela Ordem entrou.

 

Pra escapar de Teodora,

sua mãe brava e mandona,

puseram-no em fuga embora

seus amigos para Roma,

 

e de lá para Paris

ele seria enviado,

mas a Providência quis

que fosse capturado,

 

pois no meio do caminho,

seus irmãos o aprisionaram,

e o coitado do irmãozinho

pra casa preso levaram.

 

No castelo de seus pais

um ano ficou detido,

mas, ficasse ele dez mais,

jamais seria vencido,

 

pois a Deus sua obediência

muito mais era devida,

e, perdendo a paciência,

sua mãe se deu por vencida,

 

e, liberto o prisioneiro

daquele imenso pepino,

seguiu seu santo sendeiro,

foi ser São Tomás de Aquino.

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ESMERIL NEWS | LITERATURA






👆 OLAVO DE CARVALHO | Crônica de um converso à Fé
(por Vitor Marcolin - 25/01/2022)



Não foram os “tradicionalistas” de charuto grosso e de chapéu os responsáveis pela minha conversão

Relativamente a muitos dos camaradas do COF, conheci o trabalho do professor Olavo há pouco tempo, foi na ocasião do lançamento do livro O mínimo, primeiro dos livros do professor que li. Pouco antes, anteriormente à minha conversão à Fé Católica, eu ouvira falar sobre o Olavo num vídeo de um canal sobre Teologia no YouTube. No vídeo, um dos apresentadores disse uma frase — e o outro concordou de imediato — que me caiu como uma pulga serelepe atrás da orelha: “(…) Com o Olavo de Carvalho é amor ou ódio; há pessoas que o amam e há aquelas que o odeiam. Você precisa conhecê-lo”.

Ao cabo do vídeo fui pesquisar. O interesse era tamanho que assisti a todos os vídeos do Olavo e sobre o Olavo disponíveis no YouTube. Não demorou muito para que eu percebesse que ele falava mesmo como se estivesse numa mesa de bar na ilustre companhia de Aristóteles e de Mussum. Sua sinceridade, generosidade e desinteresse com que falava aos seus alunos — os vídeos no YouTube eram sempre trechos de suas aulas — cativaram-me. Os vídeos acabaram e, apesar de haver aqueles que, vez ou outra, disponibilizavam o conteúdo naquela plataforma, não bastavam mais para mim. Eu precisava ingressar no COF.

As primeiras páginas de O mínimo cativaram-me mais profundamente do que aqueles trechos curtos no YouTube nos quais Olavo dava generosos esporros nos maliciosos: Olavo de Carvalho era um escritor. “O estilo é o próprio homem”. Dar uma forma verbal às nossas experiências com a realidade não é uma tarefa fácil; a bem da verdade, ao lado do cultivo da Santidade, é um dos maiores desafios da vida. Naquelas primeiras páginas de O Mínimo tive uma mostra do seu vigor e habilidade no manejo das palavras. O Olavo conseguia descrever perfeitamente o que eu via e sentia do mundo à minha volta.

Atribulado com mil e uma obrigações, só pude tornar-me seu aluno no COF mais tarde, bem mais tarde. Acerca dos desígnios de Deus, o velho Isaías escrevera: “(…) Porque os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, nem os vossos caminhos, os meus caminhos, diz o Senhor. Porque, assim como os céus são mais altos do que a terra, assim são os meus caminhos mais altos do que os vossos caminhos, e os meus pensamentos, mais altos do que os vossos pensamentos (…)”. Olavo, o velho que fumava e falava palavrões no YouTube, foi o responsável pelo meu regresso à Fé Católica.

Mais, muito mais do que me confirmar para a lide na vida intelectual, essa vida bandida dos estudos sinceros, o Olavo foi um estranho — e improvável — instrumento de Deus para me arregimentar às fileiras daqueles que defendem a Fé. Non Nobis Domine. Sempre trarei na memória — e, se ela falhar, fica aqui o registro — de como aconteceu, de como se deu o meu despertar para a Fé.

Juntamente com um grupo de amigos do COF, tão logo os ingressos para o filme do Josias Teófilo foram postos à venda na plataforma online, fui um dos primeiros a comprar — numa feliz coincidência de circunstâncias. Para quem acompanhava as aulas do COF, aquilo foi como um coroamento. Na lotada sala de cinema havia um estranha sensação de vitória, como aquilo era possível? Com tantos ursos, lobos e feras selvagens rugindo à nossa volta, como ainda aquela luz podia brilhar? Não só de vitória, mas a sensação que tive naquela sala do cinema do shopping metrô Santa Cruz, aqui na capital paulista, fora também de esperança. Spes nostra!

Ao cabo da sessão, ouvimos alguns dizeres acerca da importância do trabalho do Olavo. Alguns dos seus mais aplicados alunos falaram naquela noite. O professor Rodrigo Gurgel fez um convite especial: no dia seguinte, na Paróquia de Santa Generosa, nas proximidades do metrô Paraíso, um ciclo de palestras teria início. Eu fui. Mutatis mutandis, as palestras eram como que uma extensão do COF, porque a tônica era a restauração da Fé e da Alta Cultura. Numa noite, quase no fim do ciclo de palestras, ouvi sobre Fátima, sobre a urgência de sua mensagem para o mundo. Não tinha como não ser, aquele era o momento. Converti-me.

Não foram os tradicionalistas que rezam em latim e que, antes de entrar para a missa, apagam os charutos e colocam a boina debaixo do braço, os responsáveis pela minha conversão. Um velho “boca-suja” hábil na arte de mostrar o caminho da roça aos maliciosos fora o grande responsável pelo meu regresso à Fé. Professor Olavo, obrigado por despertar em mim o amor à língua portuguesa, à literatura e, principalmente, à Fé. Agora, ao lado da Virgem Maria e do Santo Padre Pio de Pietrelcina, o senhor pode interceder por nós, seus alunos, para que “nenhuma injustiça seja cometida nesse programa [da vida]”.
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“Um dia, espero, estaremos todos lá, aos pés de Nosso Senhor, e nossas lágrimas de alegria inundarão universos inteiros”.

- Olavo de Carvalho

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Brasil Sem Medo - 27 de Janeiro





HONRA AO MESTRE

👆Olavo, o pai de todos nós
(por Gabriel Guimarães Marini)

O que, durante décadas, incontáveis milhões de gastos com universidades públicas não fizeram, um homem sozinho conseguiu fazer

Gabriel Guimarães Marini
Especial para o BSM

Olavo de Carvalho não foi meu pai per se. Mas, adorado tanto por mim, quanto por meu pai, quanto pela minha mãe (para não citar a minha falecida avó), Olavo foi um pai intelectual, tendo aberto diante de mim um sem-número de caminhos percorríveis, seja em termos puramente intelectuais, seja em possibilidades de vida.

Minha avó, por ironia do destino, havia descoberto o programa em que ele tecia comentários ao lado de José Monir Nasser em algum canal obscuro da falecida TVA. Quem diria que um fato tão fortuito pudesse direcionar meus interesses e abrir a minha cabeça para a verdade da transcendência e de Jesus Cristo, pudesse me colocar no caminho da leitura e da escrita, assim como desvencilhar meu olhar da falsidade direcionando-o para a realidade ao redor, solidificando um entendimento sobre fatos da vida que, antes, eram indicados apenas por gut feeling?

Toda a propaganda em torno do “Olavo guru de Bolsonaro” serve apenas para deformar a maior realidade de todas: o verdadeiro posto de Olavo de Carvalho na cultura lusófona é (e não “era”) o de maior ensaísta. Talvez o último usuário da língua portuguesa, seja aqui ou além-mar, a proporcionar ao público o deleite tanto artístico quanto intelectual.

Não que seja desimportante o fato de que em comparação com qualquer outro intelectual público local (e mesmo internacional). Olavo tinha uma cultura assombrosa, mas verdadeiramente notável é o fato de que a mobilização de tal erudição seria vã sem a sua experiência de vida. De muitas vidas.

Olavo foi office boy, foi militante comunista durante a ditadura. Foi jornalista na fase áurea da profissão. Foi astrólogo, professor, livreiro e tradutor. Participou de seitas iniciáticas, foi perseguido por membros quando se mostrou um maverick. Escreveu best-sellers como intelectual público e levou seus oponentes ao oblívio. Foi editor. Trabalhou junto à embaixada brasileira na Romênia promovendo negócios nacionais. Foi convidado por Alain Peyrefitte a trabalhar no Le Figaro, mas acabou indo redigir artigos e editoriais para o Jornal do Commercio e outros veículos brasileiros da Virgínia, nos Estados Unidos, onde obteve o genius visa, visto dado somente a pessoas notáveis em suas áreas. 

Estudou a astrocaracterologia. Era, certamente, dos maiores especialistas no país no campo das religiões comparadas. Foi, também, o principal especialista na obra de Mário Ferreira dos Santos, de Louis Lavelle e de Aristóteles em terra pátria (e este fato último foi sublinhado, vejam, por um detrator que, nos seus estudos avançados de filosofia na USP, ouviu de um professor algo como: “Aqui não estudamos Aristóteles a sério. Quem entende disso é o Olavo de Carvalho”). Entendia mais das diversas cepas de marxismos que os supostos estudiosos desta escola (e digo por experiência: os melhores estudiosos do marxismo e da teoria crítica da USP não estão no mesmo nível nem mesmo em termos básicos de informação sobre a bibliografia, quanto menos em termos de análise das problemáticas e tensões internas do pensamento marxista).

Mas, para além disso tudo, encontrou sua própria metodologia filosófica que, contra o mero foco estrutural-textual, e contra o historicismo cru, buscou unir estes dois vieses com a análise biográfica e com uma análise experimental interior daquilo que os autores descreviam em seus escritos. Deste método nasceram as famosas interpretações de Maquiavel, Descartes e Kant. Em paralelo, Olavo descobriu problemas importantes como a Paralaxe Cognitiva, em específico, e como a Mentalidade Revolucionária, em geral – afecções claras do espírito filosófico moderno e germes de inúmeras mazelas contemporâneas.

Como se tudo isso não fosse o suficiente, desenvolveu uma antropologia filosófica e mesmo uma filosofia da intuição (leiam o tratado de Ronald Robson sobre a filosofia de Olavo) e, com sua atuação diária, serviu de fio condutor entre a geração anterior, proprietária de uma cultura brasileira que morreu de morte matada, e a atual, nutrida, basicamente, por suas indicações e seus trabalhos, e que estaria à míngua caso dependesse dos caminhos por assim dizer tradicionais.

Para sublinhar a verdadeira ação de Olavo na história, vale usar um exemplo que ele próprio adorava. A cultura austríaca do pré-Segunda Guerra gerou uma gigantesca renovação cultural. Círculos de interessados, participantes ou não do mundo do ensino institucionalizado, encabeçados por pessoas ilustres, promoveram novos caminhos culturais de influência profunda e de longuíssimo prazo, surtindo efeitos, muitas vezes, fora dos limites territoriais da Áustria. Assim foi o Círculo de Mises, encabeçado por Ludwig von Mises, que influenciou um movimento intelectual gigantesco de pensadores pró-mercado, culminando na vitória de Reagan e Thatcher nos anos 1980. O Círculo Positivista, com nomes como Carnap e Wittgenstein, importante para o desenvolvimento da chamada Filosofia Analítica e de filosofias da ciência positivistas, ainda hoje proeminentes no ambiente anglófono. Por fim, o Círculo de George, encabeçado pelo poeta simbolista Stefan George, que renovou a linguagem alemã e deu um modelo específico de análise, por exemplo, da filosofia de Platão. Eric Voegelin, Leo Strauss e Hans-Georg Gadamer, por exemplo, sublinham pessoalmente que foram influenciados pela leitura do George-Kreis, uma leitura simbólica cujo possível ápice pode ser encontrado na obra de Paul Friedländer.

A seu modo, para alguns liberais, Olavo foi o nosso Mises. A seu modo, Olavo foi nosso Stefan George — sem ser, nominalmente, poeta. Voegelin, em diversos textos, nota a importância de Stefan George e de Karl Kraus no desvelamento da falsa linguagem em voga na Alemanha, sem o qual, seria impossível entender o declínio de uma cultura em direção ao holocausto promovido pelo partido Nacional-Socialista. Como George e Kraus, seja por escrito ou por gravações em áudio ou vídeo, Olavo renovou nossa língua, nos colocando, em primeiro lugar, numa posição em que poderíamos expressar nossos pensamentos conforme eles nos apareciam e, em segundo lugar, numa posição em que a verdade, a realidade circundante, deixaria de ser distorcida pela linguagem vulgar e degradante ainda em alta nos meios institucionais.

O que incontáveis anos de Universidade de São Paulo e inumeráveis milhões de reais gastos nas Universidades Federais não fizeram, um homem sozinho conseguiu fazer. Um homem, sozinho, pela força de sua personalidade, conseguiu renovar a cultura nacional, relembrando obras e pensadores perdidos, abrindo-nos para o influxo de um sem-número de filósofos, historiadores e intelectuais estrangeiros. Olhando por este ângulo, a elevação de Jair Messias Bolsonaro à presidência se mostra apenas como um efeito, ainda que positivo e salutar, muito lateral de um movimento que pode gerar frutos inimagináveis aos detratores, em regra incapacitados intelectualmente e moralmente amargurados.

Olavo de Carvalho, portanto, é pai de todos nós, goste-se ou não. Tomando-se consciência do fato ou não.

Assim como perdi meu pai, o seu Silvio, nós perdemos nosso pai intelectual, Olavo. Assim como meu pai, que não pode ter um velório por conta das regras relacionadas à pandemia, merecia mais, Olavo também merecia mais. Nosso herói carlyleano se foi feliz nos Estados Unidos, cercado por seus netos, sua querida esposa Roxane, e seus filhos ali residentes, numa terra que, como ele sempre disse, o tratou melhor — ainda que tenha se emocionado em sua última visita pelas inúmeras homenagens de amigos. O que ele fez pelo Brasil ele fez por amor, e o amor sempre frutifica.

Que Nossa Senhora Aparecida e Padre Pio intercedam junto ao Divino Pai Eterno para que, como ele mesmo queria, o nosso querido professor Olavo possa entrar, na surdina, pelos portões do Paraíso.

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Allan dos Santos
 - 30 de Janeiro




CULTURA / FÉ




👆 Et ecce intus eras et ego foris et ibi te quaerebam, et in ista formosa quae fecisti deformis irruebam…
(30/01/2022, via Telegram)

Santo Agostinho, Confissões 10, 27-29

1. Tarde Te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova… Tarde Te amei! Trinta anos estive longe de Deus. Mas, durante esse tempo, algo se movia dentro do meu coração… Eu era inquieto, alguém que buscava a felicidade, buscava algo que não achava… Mas Tu Te compadeceste de mim e tudo mudou, porque Tu me deixaste conhecer-Te. Entrei no meu íntimo sob a Tua Guia e consegui, porque Tu Te fizeste meu auxílio.

2. Tu estavas dentro de mim e eu fora… “Os homens saem para fazer passeios, a fim de admirar o alto dos montes, o ruído incessante dos mares, o belo e ininterrupto curso dos rios, os majestosos movimentos dos astros. E, no entanto, passam ao largo de si mesmos. Não se arriscam na aventura de um passeio interior”. Durante os anos de minha juventude, pus meu coração em coisas exteriores que só faziam me afastar cada vez mais d’Aquele a Quem meu coração, sem saber, desejava… Eis que estavas dentro e eu fora! Seguravam-me longe de Ti as coisas que não existiriam senão em Ti. Estavas comigo e não eu Contigo…

3. Mas Tu me chamaste, clamaste por mim e Teu grito rompeu a minha surdez… “Fizeste-me entrar em mim mesmo… Para não olhar para dentro de mim, eu tinha me escondido. Mas Tu me arrancaste do meu esconderijo e me puseste diante de mim mesmo, a fim de que eu enxergasse o indigno que era, o quão deformado, manchado e sujo eu estava”. Em meio à luta, recorri a meu grande amigo Alípio e lhe disse: “Os ignorantes nos arrebatam o céu e nós, com toda a nossa ciência, nos debatemos em nossa carne”. Assim me encontrava, chorando desconsolado, enquanto perguntava a mim mesmo quando deixaria de dizer “Amanhã, amanhã”… Foi então que escutei uma voz que vinha da casa vizinha… Uma voz que dizia: “Pega e lê. Pega e lê!”.

4. Brilhaste, resplandeceste sobre mim e afugentaste a minha cegueira. Então corri à Bíblia, abri-a e li o primeiro capítulo sobre o qual caiu o meu olhar. Pertencia à carta de São Paulo aos Romanos e dizia assim: “Não em orgias e bebedeiras, nem na devassidão e libertinagem, nem nas rixas e ciúmes. Mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo” (Rm 13,13s). Aquelas Palavras ressoaram dentro de mim. Pareciam escritas por uma pessoa que me conhecia, que sabia da minha vida.

5. Exalaste Teu Perfume e respirei. Agora suspiro por Ti, anseio por Ti! Deus… de Quem separar-se é morrer, de Quem aproximar-se é ressuscitar, com Quem habitar é viver. Deus… de Quem fugir é cair, a Quem voltar é levantar-se, em Quem apoiar-se é estar seguro. Deus… a Quem esquecer é perecer, a Quem buscar é renascer, a Quem conhecer é possuir. Foi assim que descobri a Deus e me dei conta de que, no fundo, era a Ele, mesmo sem saber, a Quem buscava ardentemente o meu coração.

6. Provei-Te, e, agora, tenho fome e sede de Ti. Tocaste-me, e agora ardo por Tua Paz. “Deus começa a habitar em ti quando tu começas a amá-Lo”. Vi dentro de mim a Luz Imutável, Forte e Brilhante! Quem conhece a Verdade conhece esta Luz. Ó Eterna Verdade! Verdadeira Caridade! Tu és o meu Deus! Por Ti suspiro dia e noite desde que Te conheci. E mostraste-me então Quem eras. E irradiaste sobre mim a Tua Força dando-me o Teu Amor!

7. E agora, Senhor, só amo a Ti! Só sigo a Ti! Só busco a Ti! Só ardo por Ti!…

8. Tarde te amei! Tarde Te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova! Tarde demais eu Te amei! Eis que estavas dentro, e eu, fora – e fora Te buscava, e me lançava, disforme e nada belo, perante a beleza de tudo e de todos que criaste. Estavas comigo, e eu não estava Contigo… Seguravam-me longe de Ti as coisas que não existiriam senão em Ti. Chamaste, clamaste por mim e rompeste a minha surdez. Brilhaste, resplandeceste, e a Tua Luz afugentou minha cegueira. Exalaste o Teu Perfume e, respirando-o, suspirei por Ti, Te desejei. Eu Te provei, Te saboreei e, agora, tenho fome e sede de Ti. Tocaste-me e agora ardo em desejos por Tua Paz!

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👆 ENSINAMENTOS DE OLAVO DE CARVALHO

(TdL: a partir de hoje esta seção, além de renomeada, não será mais frequente, porém procurarei trazê-la o máximo de vezes que eu conseguir pois Olavo não pode sair de nossas vidas, e será dedicada a falar de ensinos valiosos do nosso querido professor que agora habita a Cidade de Deus.)

Sobre a amizade:
Santo Tomás de Aquino dizia o seguinte sobre a amizade: "Idem velle, idem nolle".

Ou seja, é seu amigo verdadeiro aquele que quer as mesmas coisas que você e que rejeita as mesmas coisas que você. Aristóteles dizia que a amizade é a base da própria sociedade política. É um dos pilares sobre os quais se ergue a nossa PERSONALIDADE, e é fundada na comunidade de objetivos de pares e valores.
(Aula 01 do COF - 14/03/2009)

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👆OPINIÃO DO AUTOR

Olavo atingiu a camada 12
(por Ricardo Pagliaro Thomaz)
14 de Janeiro de 2022

Um texto curto, apenas para pontuar algo de suma importância. Olavo de Carvalho é o autor de um estudo original conhecido como "as 12 camadas da personalidade".

Com esse estudo, Olavo nos deu bases muito úteis para podermos construir a nossa própria personalidade de maneira forte e consistente.

Para fazer um breve resumo do que vem a ser essas 12 camadas da personalidade, basicamente consiste em 12 etapas pelas quais todo ser humano pode passar. Nem todas as pessoas vão necessariamente passar por essas doze etapas, e algumas pessoas podem até pular algumas delas. Para compreender com mais precisão, e com uma linguagem acessível, eu recomendo o episódio 42 do programa Tapa Cultural apresentado pelo jornal Brasil Sem Medo, apresentado por Bernardo Küster e Brás Oscar, onde eles falam sobre os ensinamentos de Olavo e descrevem essas 12 camadas bem brevemente.


Pois bem, com isso, eu creio que seja oportuno dizer que o professor Olavo nasceu, construiu seu conhecimento e sua personalidade ao longo da vida, e semana passada, na noite de 24 de Janeiro de 2022, foi chamado por Deus para ser um cidadão dos Céus.

E esta é a última camada pela qual passa o ser humano. O encontro com Deus.

"Creio que não teria sentimento mais mesquinho do que querer para mim o que pertence a Ti, ó DEUS. O Prof. Olavo é Seu, meu amado Senhor. É impossível não se alegrar com a ida dele para o Seu seio paternal. Só Vos imploro que eu não me perca e termine perto de Vós."
(Allan dos Santos, via Telegram, em 30/01/2022)

A conclusão de meu amigo Allan dos Santos é a mesma que a minha.

Olavo atingiu finalmente a camada 12.

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👆 HUMOR

E o Giorgio Cappelli na True Outstrips de hoje, passado o luto e o choro, volta às gargalhadas... com choro... de tanto gargalhar... ah, vocês entenderam, Oraporra®!
(28/01/2022)
(31/01/2022)



E nessa, o Sal Conservador pegou de novo a Gróbiu naquele seu conhecido desespero... mas a coisa meio que... ééééé..... é, isso mesmo, desMOROnou!
(18/01/2022)

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👆 LEITURA RECOMENDADA

Hoje também não seria dia de Olavo de Carvalho, mas como ainda estamos neste período transitório (ao menos mais essa semana), pois a morte de nosso mestre e guia é muito recente, eu vou recomendar a vocês um livro escrito por um aluno brilhante do professor, Ronald Robson. Este livro inclusive foi aprovado pelo próprio professor Olavo, que o leu página a página e deu o sinal verde para que fosse lançado pelo autor já tendo passado pelo controle de qualidade. Então meus amigos, é um livro, escrito por um aluno do COF, sobre a filosofia do Olavo de Carvalho APROVADO PELO PRÓPRIO OLAVO DE CARVALHO! Portanto, pode ler sem medo! É bem grande, e se você ainda não puder ler, reserve ele aí na sua lista de leitura. Este livro eu recomendo para quem quer se aprofundar MESMO no que o professor Olavo de Carvalho ensinava em seu Curso Online de Filosofia.

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